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O desembargador Doorgal Andrada, da 4ª Câmara Criminal do TJMG, publicou, no ano 2000, o livro “As Faces Ocultas da Justiça.” Nele, o magistrado já apontava o problema da dissociação do diálogo entre o poder público e a sociedade. Treze anos depois, essa falta de entendimento levou a uma onda de manifestações que reuniu milhões de pessoas pelas ruas do país, protestando contra os mais variados temas. Nesta entrevista à Amagis, Andrada comenta as manifestações e afirma que os poderes públicos precisam encontrar respostas para as demandas sociais.

Por que os institutos de pesquisa e os cientistas políticos não perceberam que uma insatisfação tão grande poderia ir para as ruas?
Na minha opinião, os poderes públicos, as autoridades de modo geral, estão muito dissociados da realidade. Frequentemente, vemos as propagandas dos poderes públicos federal, estadual e municipal anunciando a construção de excelentes escolas, hospitais e rodovias, mas grande parte do país vive uma realidade muito diferente.

Em seu livro “As Faces Ocultas da Justiça”, lançado em 2000, o senhor faz uma antevisão dessa situação social que vivemos hoje.
No momento em que escrevi esse livro, estávamos começando a discussão sobre a reforma do Judiciário, e percebíamos que os debates em Brasília estavam muito distantes da realidade da população, que víamos na nossa atuação no interior. Nessa época, eu já escrevia propondo a conciliação como forma de diminuir o número de processos e isso foi inteiramente repudiando, houve uma resistência total. Hoje, passados quase 15 anos, a conciliação é aplaudida como uma solução.

O senhor afirmava que o modelo havia se esgotado. O que quer dizer isso?
A legislação brasileira está estruturada ainda nos fundamentos do Estado Novo, os sindicatos, o próprio Judiciário, a estrutura da Polícia Civil, da Polícia Militar, o Congresso. Houve mudanças, mas foram superficiais. O aparelhamento tecnocrático, fruto também do Governo Militar, cresceu de tal maneira que o diálogo e a boa política foram afastados, ninguém conversa mais com o povo. No âmbito do Judiciário, a maneira como um processo tramita hoje não difere da maneira como meu avô trabalhava como advogado. A diferença é que o papel, ao invés de ir de mão em mão, vai pela informática.

O senhor considera que os governantes entenderam o recado das ruas?
Acredito que muito pouco. As respostas foram mais televisivas do que concretas. Não vejo uma legislação que mude o nosso sistema de saúde, de educação ou que dê forças melhores aos estados e municípios. Todos estão assustados e procurando um caminho, mas não encontraram ainda uma resposta.