No ano em que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais completou 140 anos, tomou posse o presidente mais jovem de sua história. Com 51 anos, Pedro Bitencourt Marcondes foi eleito o 50º comandante da história corte. Sua missão, diz, é “trazer ‘o novo’, não somente no aspecto etário, mas principalmente na modernização das práticas administrativas”.
Ainda durante sua campanha, Marcondes divulgou um plano de gestão que busca a participação de todos os juízes do tribunal — com foco nos de primeira instância, muitas vezes deixados de lado por candidatos a presidente, por não contarem voto no Pleno. Em seu discurso de posse, em junho, disse que vai democratizar tanto a atuação administrativa quanto as discussões sobre elaboração do orçamento da corte.
Em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico, Marcondes se mostrou favorável a adotar uma remuneração variável aos magistrados, de acordo com o cumprimento de metas estabelecidas pela corte — desde que o prêmio seja criado por lei. “Não mais se admite a gestão que não busque resultados, e no Poder Judiciário isso não pode ser diferente”, diz.
Com o objetivo de ter 65% das ações no sistema do Processo Judicial Eletrônico até o fim de 2015, o desembargador é crítico à imposição do PJe pelo Conselho Nacional de Justiça sem levar em conta os investimentos já feito por tribunais em outras ferramentas. A comunicação entre os diversos sistemas é classificada por ele como essencial.
Ao responder por e-mail a perguntas enviadas pela ConJur, Marcondes aproveitou para avaliar a atuação do CNJ. Para ele, o órgão “acerta no atacado, ao exercer o legítimo papel de gestor das políticas judiciárias, e às vezes erra no varejo, ao se imiscuir em demasia em assuntos internos dos tribunais”.
Natural de Caçapava (SP), o presidente do TJ-MG foi promotor de Justiça e ingressou na magistratura em 1990, passando pelas comarcas mineiras de Mantena, Ituiutaba e Contagem. Em Belo Horizonte, foi juiz da 2ª Vara de Fazenda Pública e Autarquias. Tornou-se desembargador em abril de 2006.
Leia a entrevista:
ConJur — Qual modelo de gestão considera adequado para aperfeiçoar o funcionamento de um tribunal?
Pedro Marcondes — Participativa e transparente, com foco na primeira instância. Em meu programa de gestão, apresentado ainda durante a campanha, são privilegiadas a participação de todos os magistrados na definição das prioridades do tribunal, com a implantação do orçamento participativo e a submissão de todas as decisões às comissões da casa. Além disso, criamos canais de prestação de contas e de comunicação dos atos da presidência, por meio eletrônico.
Em relação à primeira instância, fazemos, no momento, um grande esforço para a implantação do PJe nas comarcas da capital e do entorno de Belo Horizonte, para modernizar e agilizar a prestação jurisdicional. A meta é implantar, até o fim desse ano em Belo Horizonte, Betim e Contagem, e, em 2015, nas 28 comarcas de entrância especial — o que corresponde a 65% dos processos em andamento no Judiciário mineiro.
ConJur — Acredita na possibilidade de adotar remuneração variável de acordo com o cumprimento de metas em um tribunal?
Pedro Marcondes — É inegável que o estabelecimento de metas de trabalho deve ser adotado, como forma de modernização do serviço público. Não mais se admite a gestão que não busque resultados e, no Poder Judiciário, isso não pode ser diferente. Por isso, reformulamos o nosso planejamento estratégico, para adequá-lo à realidade, com o estabelecimento de metas.
Nesse contexto, a premiação, ainda que pecuniária, para o cumprimento das metas estabelecidas não se apresenta incompatível com a gestão judiciária, mas é preciso cuidado com a regulamentação do prêmio de produtividade a ser estabelecido em lei. Tramita na Assembleia Legislativa de Minas Gerais um projeto de lei sobre o assunto.
ConJur — Qual sua avaliação do papel do CNJ, hoje?
Pedro Marcondes — O Conselho Nacional de Justiça acerta no atacado, ao exercer o legítimo papel de gestor das políticas judiciárias e, às vezes, erra no varejo, ao se imiscuir em demasia em assuntos internos dos tribunais. Temos que levar em consideração, nesta análise, não só o tempo de existência do Conselho, que não é longo, mas também a mudança periódica de composição, que, embora democraticamente salutar, altera, em alguns casos, os entendimentos já consolidados e as diretrizes da instituição. Mas, no geral, os tribunais devem ver no CNJ um parceiro para as iniciativas de modernização da Justiça e, em havendo a discordância com as decisões do Conselho, buscar a salvaguarda, democrática e republicana, do Supremo Tribunal Federal.
ConJur — Como vê a intenção da nova direção do CNJ de devolver às corregedorias todas as queixas que foram para Brasília sem passar por elas?
Pedro Marcondes — Vislumbro a medida como consentânea com o móvel da criação do Conselho, que não se destina a substituir as corregedorias. Ainda mais em se considerando que uma das funções do CNJ é rever os atos administrativos e disciplinares dos tribunais.
ConJur — É a favor da participação dos juízes de primeira instância na eleição da direção dos tribunais?
Pedro Marcondes — Sim, desde que observados determinados parâmetros. Assim como ocorre no Ministério Público, poderemos adotar um critério duplo de escolha, com a eleição de três desembargadores pelos magistrados de primeiro grau, cujos nomes seriam submetidos ao Tribunal Pleno, para a escolha do presidente. Além disso, acho que toda a discussão relacionada à democratização do Poder Judiciário é válida e deve ser estimulada, para finalmente ser levada ao foro apropriado, que é o Congresso Nacional, já que a mudança demanda alteração constitucional.
ConJur — Como vê a implantação do Processo Judicial Eletrônico? Ao definir um sistema e deixar de lado os investimentos feitos por tribunais em outros sistemas, o CNJ passou por cima da autoridade das cortes?
Pedro Marcondes — A unidade do Judiciário nacional perpassa obrigatoriamente pela necessidade de falarmos a mesma língua. Logo, a adoção de sistema de processo eletrônico uniforme em todo o país certamente viria em benefício da regularidade da prestação jurisdicional. Todavia, não podem ser desconhecidas as escolhas já feitas e os respectivos investimentos, além, é óbvio, da autonomia dos tribunais em matéria de organização interna. É por isso que é indispensável a interoperabilidade dos sistemas a serem adotados pelos tribunais.
ConJur — Como ser o presidente mais jovem da história do TJ-MG vai influenciar em sua gestão?
Pedro Marcondes — Recebo com orgulho o fato de ser o mais jovem presidente do bicentenário Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Mas, por outro lado, vejo essa confiança que me foi outorgada pelos meus pares não apenas como um galardão pessoal, mas sim com a responsabilidade, a ser exercida com o auxílio dos magistrados e servidores, de trazer “o novo” não somente no aspecto etário, mas principalmente na modernização das práticas administrativas, com transparência e eficiência na gestão pública. Concorri na eleição com outros três desembargadores, e tenho a certeza de que todos, independentemente da idade, estavam imbuídos das melhores intenções para dirigir o tribunal. Todavia, ao chancelarem o meu programa de gestão, apesar da minha idade, creio que os membros do Tribunal Pleno acreditaram nas minhas propostas e na minha capacidade de realizá-las, o que atrai a grande responsabilidade que hoje carrego, de dirigir um dos maiores tribunais do país.
ConJur — O que se pode esperar do TJ-MG em relação a conciliações? Elas devem ser feitas fora do Judiciário ou cabe à Justiça cuidar também disso?
Pedro Marcondes — Atualmente, temos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania instalados em diversas comarcas do estado, para conciliações em feitos judiciais e em procedimentos pré-processuais. Acredito que temos que investir na conciliação, não apenas como método de pacificação de conflitos, mas também para minorar as demandas judiciais que atualmente abarrotam os diversos fóruns e tribunais do país. Mas também creio que essa importante iniciativa não deve ser relegada apenas ao Poder Judiciário. Nosso orçamento é finito e abarca inúmeras iniciativas. Logo, todos os atores da cena judicial devem assumir uma parcela de responsabilidade, já que a conciliação a todos interessa e beneficia.
ConJur — O estado de Minas Gerais é conhecido por ter um baixo nível de litigância — em 2010, eram sete novos processos por grupo de 100 mil habitantes. Por que isso se dá? Isso facilita o trabalho do tribunal?
Pedro Marcondes — São vários os motivos, mas, a meu aviso, dois são os principais: o cultural, devido a valorização do diálogo e da conciliação do mineiro; e a baixa densidade demográfica de algumas regiões. Nos últimos anos contamos com uma considerável distribuição de novos processos, o que torna relevante o foco da atual administração na primeira instância, para tentar diminuir o acervo hoje existente e agilizar com qualidade a prestação jurisdicional. Pretendemos que, ao fim deste biênio, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais seja conhecido não apenas pela baixa litigiosidade do povo mineiro, mas principalmente por possuir uma Justiça ágil e eficaz, derivada de uma gestão que atingiu o objetivo de ser participativa, transparente e voltada tão só e unicamente à consecução do interesse público.
Fonte: Consultor Jurídico