Nesta terça-feira, 2 de julho, véspera do aniversário de 156 anos do município de Montes Claros, a Polícia Federal deflagrou a Operação Violência Invisível com o objetivo de desarticular organização criminosa que desviava recursos públicos de mais de 100 municípios nos estados de Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo, Sergipe, Para, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraíba, Maranhão, e Bahia, a partir de fraudes em processos licitatórios destinados à aquisição de créditos escriturários e consolidados da Secretaria de Receita Federal (também conhecidos como precatórios).
Em alguns municípios como Várzea da Palma e Varzelândia, as licitações simplesmente desapareceram, enquanto que em Capelinha e Pirapora o processo licitatório foi revogado pelo Executivo, segundo as investigações reveladas pelo delegado-chefe da Policia Federal em Montes Claros, Marcelo Freitas, que fez questão de frisar que as investigações que apuraram as fraudes aconteceram antes das manifestações populares que atingiram o Brasil. Entre as irregularidades constatadas existia a ilegalidade do objeto da licitação; o direcionamento dos processos licitatórios; e a ausência de orçamentos e de pesquisas de mercado. Os técnicos criminais também identificaram divergências de carimbos; manipulação das licitações; e a inserção de folhas, posteriormente, na documentação.
Foram expedidos 53 mandados judiciais: nove mandados de prisão temporária; 20 de busca e apreensão; 21 de sequestro de valores, bens móveis e imóveis; e três de condução coercitiva. Entre os objetivos dos mandados de prisão estão o ex-prefeito de Montes Claros Luiz Tadeu Leite (PMDB); o ex-prefeito de Pirapora, Warmillon Fonseca Braga (DEM); e o ex-prefeito de Janaúba, José Benedito Nunes (PT); além de servidores que participaram de comissões de licitações e assessoria jurídica nos municípios.
O advogado Farley Menezes, objeto de um dos mandados de coerção, esteve na Delegacia da Polícia Federal em Montes Claros onde prestou esclarecimentos. Ao sair, afirmou que foi convocado como testemunha, que presta serviço para diversas prefeituras no Norte de Minas e que emitiu alguns pareceres contrários sobre compensação de precatórios de terceiros. “Alguns municípios seguiram os pareceres, outros não”, se limitou a declarar.
O advogado do ex-prefeito Luiz Tadeu Leite, Sanzio Baioneta, também esteve na sede da PF e declarou que seu cliente viajou para o exterior, pois não existia nenhum impedimento, e que “há a intenção de esclarecer os fatos”. O advogado ainda lembrou que Tadeu Leite passa por problemas de saúde e que “perdeu parte do intestino grosso e estava internado em um hospital dos Estados Unidos”.
Dos nove mandados de prisão expedidos pela Justiça, apenas dois deles ainda estão em aberto sendo um deles do ex-prefeito Tadeu Leite que se encontra em Miami, Estados Unidos, onde é procurado pela Polícia Imigratória e de Alfândega dos Estados Unidos. “Se encontra foragido da Justiça com mandado de prisão em aberto difusão vermelha”, informou o delegado-chefe da Policia Federal em Montes Claros, Marcelo Freitas, sobre a situação do ex-prefeito de Montes Claros, apesar de não citar o nome de Tadeu Leite como faz com todos os envolvidos. “É apenas questão de tempo. Após ser preso, retornará ao Brasil e será trazido para Montes Claros.” Marcelo Freitas afirmou que o ex-prefeito está no exterior desde o dia 14 de maio, deste ano, o que foi detectado por pesquisas da inteligência da PF. “Se a prisão não for efetivada, o pedido de extradição será realizado”, completou o delegado.
O delegado-chefe da Policia Federal, Marcelo Freitas ainda declarou que a operação deflagrada nesta terça-feira teve como objetivo minimizar a questão da corrupção na região. “O Código Penal brasileiro foca delitos comuns e deixa de lado crimes de extrema gravidade: a corrupção pública”, criticou. “Mas os órgãos estão atentos!”, acrescentou.
O delegado ainda falou do que chamou de “sangria de milhões de reais do sofrido Norte de Minas” realizada pela organização criminosa que utilizava “créditos que não podiam ser compensados por expressa proibição da legislação (se referindo ao artigo 74 da Lei 9.430/96 e das Instruções Normativas 900/2008 e 1.300/2012 da Receita Federal)” e “títulos que não existiam”. “Nenhum município poderia compensar esses créditos! Além de inábeis, eram falsos, podres”, declarou.
Marcelo Freitas ainda contou o Município de Montes Claros foi notificado das irregularidades e que, em sua defesa formal, utilizou documentação falsa através do ofício 302/2012 onde aparece o nome de Ângelo da Silva Marim como funcionário da Receita Federal. Freitas aproveitou a presença da imprensa para anunciar que o suposto subscritor de algumas habilitações de crédito - Cláudio Maia Silva - não é nem nunca foi auditor da Receita Federal.
Para Freitas, “Dá um gosto amargo na boca combater corrupção pública!”, mas a colaboração da imprensa, segundo ele, é fundamental. O promotor de Justiça da Promotoria do Patrimônio Público, Paulo Márcio da Silva, ainda falou a respeito do flagelo que é combate à corrupção na Administração Pública: “Se dizem que não tem saúde e educação de qualidade porque não tem dinheiro, é mentira!...”, afirmou indignado sugerindo que o dinheiro não chega às obras, programas e projetos que beneficiariam à população em razão da corrupção na Administração Pública.
Valores
Os valores desviados - apenas dos municípios mineiros - ultrapassam os R$ 71 milhões (R$ 71.929.159,74). Para se ter uma ideia, em Capelinha, foram desviados R$ 4.537.413,91, o que ganha mais importância em razão do baixo Produto Interno Bruto do município de 35 mil habitantes: cerca de R$ 217 milhões, em 2010. Em Pirapora, R$ 2,8 milhões seriam pagos, o que foi suspenso em virtude da divulgação das irregularidades pela mídia em dezembro de 2012. “É dinheiro que se foi e não volta mais! Não tenho dúvidas que o grupo já ocultou o dinheiro”, lamenta Marcelo Freitas.
Municípios
Os municípios mineiros onde ocorreu a ação criminosa da organização foram: Águas Vermelhas, Capelinha, Caratinga, Ipatinga, Itambacuri, Janaúba, Montes Claros, Pirapora, Rio Pardo de Minas, Várzea da Paula e Varzelândia, além do Consórcio Intermunicipal de Saúde da Rede de Urgência do Norte de Minas (CISRUN). A Operação Violência Invisível aconteceu através da parceria da Policia Federal com o Ministério Público Federal e Estadual, Receita Federal e Tribunal de Conta do Estado de Minas Gerais.
Os acusados responderão por crimes contra a administração pública, formação de quadrilha, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva e fraude em licitações. Caso sejam condenados, as penas máximas podem atingir 30 anos de detenção.
Comemoração
Por volta das 10 horas da manhã, com a multiplicação das informações sobre a operação da PF e sobre os mandados de prisão, inclusive pelas redes sociais, algumas pessoas se agruparam nas imediações da sede da PF, que está localizada há cerca de 100 metros da Prefeitura de Montes Claros. Alguns jovens – muitos deles ligados a partidos políticos - chegaram a soltar fogos de artifício como José Inácio Alves Junior, 18 anos, que acreditava na culpa dos envolvidos. “Fiquei sabendo pelas redes sociais”, contou o jovem. Questionado sobre a culpa dos envolvidos que foram alvo da Operação Violência Invisível, o jovem foi seco: “Com certeza!”.
Fonte: O Tempo