Por maioria de votos, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça manteve a demissão de uma ex-policial federal que buscava a anulação do ato administrativo que a demitiu, por considerá-lo excessivo. No exercício do cargo, a então policial incluiu na lista de interceptações telefônicas autorizadas judicialmente um número de telefone de seu interesse particular.
Ao analisar o Mandado de Segurança, a relatora do processo, ministra Eliana Calmon, concluiu que a conduta da policial se enquadrou no inciso XLVIII do artigo 43 da Lei 4.878/1965. Este dispositivo considera como transgressão disciplinar aproveitar-se, abusivamente, da condição de funcionário policial. Como a mesma lei, no artigo 48, inciso II, submete esse tipo de infração à pena de demissão, a ministra considerou que não houve excesso na punição.
“Não se verifica desproporcionalidade excessivamente gravosa em relação à impetrante que justifique a intervenção do Poder Judiciário quanto ao resultado do processo administrativo disciplinar, em que a autoridade administrativa concluiu pelo devido enquadramento dos fatos e aplicação da pena de demissão”, disse Eliana Calmon.
Processo administrativo
No primeiro processo administrativo movido contra a policial, a comissão disciplinar concluiu pela aplicação da pena de suspensão, por entender que a transgressão se enquadrava no inciso VIII do artigo 43 da Lei 4.878/1965 — praticar ato que importe em escândalo ou que concorra para comprometer a função policial.
Também foi imputada à servidora a conduta prevista no inciso XLVIII do mesmo dispositivo legal — prevalecer-se, abusivamente, da condição de funcionário policial —, mas quanto a essa acusação, sujeita à pena de demissão, a comissão decidiu pelo arquivamento.
Meses depois, o superintendente regional da Polícia Federal entendeu que o relatório da comissão concluiu contrariamente às provas dos autos e designou uma segunda comissão disciplinar para melhor investigação dos fatos. No relatório conclusivo, a segunda comissão entendeu que a infração cometida estava enquadrada no inciso XLVIII do artigo 43 da lei e a servidora foi demitida.
Sem vantagem
Inconformada, a policial impetrou mandado de segurança no STJ. Alegou que a punição foi desproporcional. Para ela, não houve dolo em sua conduta, pois apenas incorreu em erro ao incluir número de telefone para interceptação que não era objeto de investigação, sem que tenha tido qualquer tipo de vantagem pessoal.
A policial questionou ainda a legalidade da segunda comissão formada. De acordo com a Lei 4.878, o processo disciplinar só pode ser promovido por comissão permanente e, além disso, segundo a servidora, um dos membros da comissão disciplinar foi substituído durante o processo, fato que tornaria o caráter da comissão temporário.
A ministra Eliana Calmon, relatora, não acolheu os argumentos. Além de considerar que não houve excesso, a ministra afastou também a contestação da legalidade da segunda comissão. Em seu voto, a ministra apontou que a exigência de que a apuração da transgressão seja feita por comissão permanente não condiciona que seus membros sejam da mesma lotação dos investigados nem impede a substituição de seus membros.
"Barriga de aluguel"
O ato da policial demitida não é incomum. Em 2009, ao concluir o relatório final da CPI das Escutas Telefônicas, o deputado Nelson Pellegrino (PT-BA) sugeriu que fosse criado um dispostivo na legislação exigindo fundamentação do juiz específicando a autorização para cada linha interceptada.
“Com o necessário zelo, cautela e rigor por parte das autoridades, muitas mazelas poderão ser evitadas, tais como a interceptação de homônimos, e as ‘barrigas de aluguel’, em que números de telefones de pessoas estranhas à investigação são inseridas no pedido feito à autoridade judicial, que atuando sem a devida cautela e zelo, autoriza a medida. O resultado: violações à intimidade e privacidade de cidadãos brasileiros, com graves consequências para sua vida particular e de sua família”, explica Pellegrino em seu relatório, que foi entregue ao Supremo Tribunal Federal no mesmo ano.
Em 2007, o Ministério Público denunciou dois policiais em um caso de "barriga de aluguel". Eles incluiram um dos telefones celulares do escritório do advogado Roberto Podval, em São Paulo. Segundo o MP, os policiais alegaram que a linha era de membros do Primeiro Comando da Capital, o PCC. "Na verdade, a referida linha telefônica estava cadastrada em nome de ‘Advocacia Podval’, cujos integrantes não eram alvo de investigação, tanto que seus nomes jamais foram citados no correr do inquérito policial”, afirmou o Ministério Público. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Fonte: Conjur