A Corte Europeia de Direitos Humanos determinou que Portugal pague uma indenização de 4 mil euros (cerca de R$ 9 mil) para uma jornalista que foi punida por divulgar informações protegidas por segredo de Justiça. A decisão da corte ainda não é final, mas joga luzes sobre o que o tribunal europeu considera razoável quando o assunto é a responsabilidade dos jornalistas em não tornar público aquilo que não deveria ser.
Em Portugal, o Código de Processo Penal estabelece que é crime de desobediência reproduzir peças processuais ou documentos anexados ao processo até que seja dada sentença de primeira instância, salvo se o juiz tiver dado autorização expressa para isso. Também é crime a divulgação de nomes de vítimas de crimes sexuais, exceto se elas permitirem que a sua identidade seja revelada, e a publicação de conversas gravadas por grampo judicial, exceto se não estiverem sob segredo de Justiça e os interlocutores autorizarem a divulgação.
Na terça-feira (28/9), uma câmara da Corte Europeia de Direitos Humanos anunciou que os juízes portugueses não podem aplicar cegamente a vedação imposta aos jornalistas pelo Código de Processo Penal. Caso contrário, estariam violando a liberdade de expressão. A corte reconheceu os deveres dos jornalistas de respeitar a reputação das pessoas e evitar a divulgação de informações sigilosas, mas considerou que qualquer decisão sobre isso deve levar em conta a liberdade de expressão e o interesse da sociedade naquilo que foi divulgado.
Em 2006, a jornalista portuguesa Sofia Pinto Coelho foi condenada pela Justiça portuguesa a pagar multa por ter mostrado, em uma reportagem na televisão, a acusação e a ordem da Promotoria que abriu inquérito contra o antigo diretor-geral do departamento responsável por investigações criminais no país. Para a corte europeia, foi violada a liberdade de expressão de Sofia, já que a divulgação das peças processuais era necessária para embasar uma reportagem de interesse do público português.
Dever da imprensa
A responsabilidade da imprensa por divulgar informações protegidas pelo segredo de Justiça já foi defendida pelo presidente do Tribunal Constitucional de Portugal, Moura Ramos. Em entrevista exclusiva à Consultor Jurídico, ele argumentou que o órgão de comunicação deve indenizar sempre que causar danos para alguém com essa divulgação. No entanto, rebateu a necessidade de responsabilização criminal do jornalista e defendeu que haja uma investigação para saber a raiz da quebra do sigilo judicial. “Quando a imprensa divulga algo que está em sigilo, está violando a lei. Mas, para que isso acontecesse, alguém violou antes. A irregularidade cometida pela imprensa está associada à irregularidade cometida por outro”, disse.
Em julho do ano passado, a Itália ficou um dia sem notícias nos jornais, na televisão e na internet por causa de uma greve dos jornalistas contra o que eles chamam de projeto de lei da mordaça. O projeto, defendido pelo governo de Berlusconi, tornava mais rigorosa a pena para aqueles que publicassem resultado de escutas telefônicas ou e-mail interceptados judicialmente.
Hoje, na Itália, o jornalista que publica conversa interceptada protegida por sigilo já se arrisca a ficar um mês na cadeia ou pagar multa de quase 300 euros (o equivalente hoje a aproximadamente R$ 670). Pela proposta inicial do governo, que já tinha passado pela Câmara dos Deputados italiana, a proibição se estenderia para atos da investigação, que só poderiam ser publicados depois do término das audiências preliminares, e o conteúdo de conversas gravadas, só no fim do processo. A proposta aumentava a multa para 10 mil euros (cerca de R$ 22 mil) ou, então, um mês na cadeia. O sindicato dos jornais, na época, reclamou que nenhum profissional da área teria condições de pagar esse valor e, por isso, teria que cumprir a pena na cadeia.
O projeto de lei, que começou a ser debatido no Senado, acabou sendo deixado de lado pelo governo de Silvio Berlusconi, em meio à crise política que se instalou no país no ano passado.
Fonte: Consultor Jurídico