Mesmo sem uma previsão legal, um juiz pode suspender um processo quando entender que a pena não tera resultado prático - ou seja, antes que ela seja aplicada, ela já terá reconhecida sua prescrição. A prescrição virtual ou antecipada, originária de década de 80, é uma doutrina aceita nas instâncias inferiores, mas rejeitada nas Superiores. A polêmica, que tem fortes argumentos contra e a favor da aplicação, decorre de comum acordo entre juiz e promotor.
Apesar de a tese ainda ser minoritária, o professor de Direito Penal da Universidade Federal de Mato Grosso, Francisco Afonso Jawsnicker afirma que ela pode ser uma saída para limpar o estoque de processos acumulados nas Varas Criminais. Embora reconheça que ela não é a a melhor solução para termos uma Justiça mais célere, aponta que acarretará em uma economia de recursos públicos e uma melhor eficiência no trabalho dos juízes. “Isso ocorre porque temos uma instituição mal aparelhada, o ideal é contar com a estrutura necessária para termos um processo rápido, assim como assegura a Constituição”, recomenda.
Segundo o professor, a prescrição virtual pode ser aplicada em processos mais antigos, que estão parados no gabinete há muito tempo. Os que forem de pequeno e médio potencial lesivo, terão uma pena baixa, e consequentemente podem prescrever retroativamente. Então o juiz se antecipa e encerra o processo antes mesmo de gerar mais gastos para o judiciário.
“Aplica-se a prescrição antecipada na falta de interesse de agir, se, no caso concreto, concluir-se que eventual pena imposta será inevitavelmente atingida pela prescrição retroativa, resultando que a prestação jurisdicional buscada será inútil. É um processo inútil, porque sem nenhum resultado prático, constitui constrangimento ilegal que não pode ser tolerado num Estado Democrático de Direito. Os princípios da instrumentalidade do processo, da economia processual e da moralidade também são invocados pelos partidários da prescrição antecipada,” diz o professor.
De acordo com o especialista, a prescrição da pretensão punitiva é subdividida em três tipos: a abstrata, a retroativa e a superveniente. Dentro da retroativa se encaixa a antecipada, isso porque ela é o reconhecimento da inevitável prescrição retroativa.
A prescrição antecipada tem sido admitida por alguns tribunais estaduais e federais. É o caso da do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, conforme entendimento da desembargadora Laís Rogéria Alves Barbosa, em julgamento da 2ª Câmara Criminal no dia 30 de setembro de 2004: “Ratifica-se o entendimento adotado pelo Juízo a quo, que extinguiu a punibilidade, com a adoção de uma forma de prescrição antecipada, atentando-se à real finalidade de um processo, o que envolve, necessariamente, o vislumbrar-se de eventuais conseqüências práticas do mesmo”, decidiu.
Em julgamento no dia 16 de março de 2005, o desembargador Élcio Pinheiro de Castro da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sustentou que a “prescrição pela pena em perspectiva, embora não prevista na lei, é construção jurisprudencial tolerada em casos excepcionalíssimos, quando existe convicção plena de que a sanção aplicada não será apta a impedir a extinção da punibilidade”, observou.
Impunidade
O principal argumento contra a aplicação da medida, é evitar a impressão de impunidade que a prescrição antecipada causa. Para seguir a doutrina, dizem os opositores da prescrição virtual, o juiz precisa condenar, ainda que hipoteticamente, o acusado para depois aplicar a prescrição antecipada.
A tese viola também os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. E por fim, o princípio da legalidade, isso porque não existe uma lei que estabeleça os critérios para a aplicação da extinção.
Essa modalidade prescricional não é acolhida nos tribunais superiores. Conforme decisão do ministro Eros Grau, de 26 de maio de 2009, “a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido de não admitir a prescrição antecipada pela pena em perspectiva”.
O ministro Napoleão Nunes Maia Filho do Superior Tribunal de Justiça também rejeita a prescrição, como afirmado em decisão de 29 de abril de 2009. “Não se admite o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva com base em pena virtual, a dizer, aquela que provavelmente seria fixada em caso de condenação, hipótese não contemplada na legislação de regência”.
O Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, segue os tribunais superiores. “A prescrição antecipada da pena contraria o sistema legal vigente, pois tem como referência uma condenação hipotética que revela o prejulgamento da causa, em flagrante desrespeito às garantias constitucionais da presunção da inocência, do devido processo legal e da ampla defesa”, afirma o desembargador Paulo da Cunha, em decisão do dia 2 de outubro de 2008.
Legislativo
No Congresso, tramita uma série de projetos de lei que prevêem o fim da prescrição retroativa. Projeto do deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ), se encontra na mesa do presidente da República para sanção. Outra iniciativa sobre a matéria, encontra-se no Projeto de novo Código de Processo Penal. "O projeto dá ao juiz a opção de receber ou não a denúncia quando perceber que a prescrição pode acontecer", diz Afonso
Fonte: Consultor Jurídico