O presidente da Amagis (Associação dos Magistrados Mineiros), Herbert Carneiro, visitou as comarcas de Alfenas e Varginha na segunda-feira, dia 11. Em Alfenas, além da cortesia, vários assuntos foram discutidos com os juízes da comarca. Ele tem visitado várias cidades, “numa função itinerante como presidente da Amagis.”
No momento, diz ele, um dos principais assuntos do Judiciário é a discussão de leis de interesse do próprio Judiciário, como a lei de organização deste Poder que está sendo implantada. “No caso de Minas Gerais, o TJ (Tribunal de Justiça) está aprovando o planejamento estratégico, que vai definir as ações a serem implantadas pelos próximos três anos.”
Uma das ações já definidas é a implantação do processo judicial eletrônico. Segundo Carneiro, ele será implantado primeiramente nas chamadas entrâncias especiais, que são as comarcas maiores. Mas, ressalta, já em 2016, comarcas como a de Alfenas serão beneficiadas. “Vamos acabar com o papel. Teremos computadores com base de dados”, de forma que advogados, promotores, defensores e juízes possam agilizar suas ações dentro de um processo. “Para nós, é o mais fundamental possibilitar a otimização do trabalho e agilizar o processo, para que seja econômico, célere e eficiente”, afirma.
Uma questão defendida pelo presidente da Amagis é que a Justiça ainda é distante do povo. Para mudar esta realidade, ele explica que é preciso investir cada vez mais em conciliação, mediação e justiça restaurativa. “O cidadão está acostumado: tem um problema, vai para a Justiça tentar resolvê-lo por meio de um processo. Em outros países, a Justiça é a última a ser procurada. Primeiro o cidadão tentar de outras formas de conciliação, evitando o sofrimento de um processo. E muitas questões são resolvidas extrajudicialmente.” Para ele, se bem feita, a conciliação evita que todo problema seja judicializado.
O mesmo acontece com a mediação. Carneiro acredita que se o mediador for uma pessoa experimentada, não há necessidade de um juiz para um bom número de ações. “As partes conversam e tentam resolver o assunto. No Brasil, usamos muito pouco isso”, explica.
Outro investimento a ser feito é na Justiça Restaurativa. O magistrado afirma que é preciso resgatar a pessoa da vítima e também do réu, para evitar a reincidência do crime. Os tribunais, ressalta, estão chegando à conclusão de que é preciso ter outras estruturas para se fazer Justiça, pois os fóruns não conseguem suportar a demanda.
Como exemplo, citou que no Brasil há 93 milhões de processos judiciais para 15 mil juízes. De forma que há casos de um juiz ter mais de 30 mil processos para julgar. “É humanamente impossível. A maioria dos juízes está assoberbada de trabalho. O ideal seria cada um ter, no máximo, três mil processos sob sua responsabilidade.”
Demandas
No caso mais específico de Alfenas, um dos problemas apontado pelos juízes é a falta de espaço. O fórum como um todo não comporta as necessidades da população de Alfenas e Serrania. Por exemplo, a garagem é utilizada como arquivo.
O presidente da Amagis viu principalmente as dificuldades da área de execução penal. O presídio da cidade tem quase mil presos, mas faltam juiz, servidores, equipamentos modernos e espaço físico para a execução de penas. Daí a necessidade de implantação do processo eletrônico, capacitação de servidores e equipamentos para estruturar melhor a área.
Especialista em questões penitenciárias, ele vê este segmento compartimentado. “Não há mistura”, disse, explicando que a parte administrativa da pena, o dia-a-dia do réu, é feita na penitenciária. A parte jurisdicional acontece no fórum. Se um preso estiver em regime de progressão de pena, isto é decidido no fórum, mas a execução é na administração. “Ocorre que não há ligação. Temos ilhas, cuja ponte é o papel. Tudo é feito por meio de ofício e outros documentos. É falho e ineficiente”, ressalta.
Para ele, se houver inter-relação, todo o processo se agiliza e toda a sociedade se beneficia. “Temos de ter um sistema interligado. Se o cidadão cometer um crime, isto já vai para o sistema, eu como juiz ficarei sabendo, a polícia e a penitenciária também.”
Sobre eleições, o magistrado afirmou que os juízes têm papel importante desde o início do processo até a diplomação dos eleitos. Ele considera que a eleitoral é uma das justiças especializadas mais eficientes do país. Um dos motivos é justamente porque boa parte do processo é eletrônica. Outro é que há um sistema de plantão, em que se um juiz tiver uma dúvida, por meio do computador se comunica com o Tribunal Regional e, em minutos, recebe orientação.
Redução da maioridade penal
Hernert Carneiro se posiciona contrário à redução da maioridade penal. Segundo ele, pela sua experiência, a medida não resolve a situação de criminalidade. O presidente da Amagis diz que há três tipos de propostas no Congresso Nacional. A primeira delas quer simplesmente reduzir a maioridade. Em alguns casos, fala-se até em redução para 13 anos de idade. “Dizem que é preciso punir com mais severidade e que o adolescente infrator sabe o que está fazendo, que age com dolo”.
Para ele, “isto é um equívoco. Pela análise biopsicossocial deste jovem, nós sabemos que ele não tem a mesma consciência dos seus atos como um adulto. O que querem é colocá-lo na cadeia, onde a chance de recuperação é zero. Querem tirá-lo do centro de internamento, que já não é bom, e levá-lo para um presídio superlotado. Se isto recuperasse alguém, mais de 170 mil presos teriam tido esta recuperação e não reincidido no crime”, ressalta.
A segunda proposta é a que defende a prisão de adolescentes que cometerem crime hediondo. “O Brasil nem sabe o que é crime hediondo. A lei 8.072/90 é uma cópia de uma lei dos Estados Unidos, que não se aplica aqui. Se fosse boa, teríamos redução desses chamados crimes hediondos. Mas, ao contrário, eles aumentaram. Isto é prova que a lei não presta.” Além disso, explica, menor de idade, de acordo com a Justiça, não comete crime, mas sim infrações. “Então, não se gradua o que ele fez pela gravidade, mas pelo seu perfil biopsicossocial, pela capacidade de recuperação.”
E, por fim, há a proposta de aumentar o tempo de internação, quando a decisão for pela medida educativa. “Não podemos simplesmente aumentar de três para seis anos, como se o centro fosse uma cadeia. Isto não recupera ninguém. Se tivéssemos um programa de recuperação eficiente, aí sim, eu seria favorável”, diz, afirmando que cada vez mais o jovem é atraído para o crime. “Ele não tem possibilidade de estudo e emprego, mas quer um tênis ou uma calça de marca. Como o estado é ineficiente, a criminalidade o capitaneia.”
Fonte: Jornal dos Lagos (Alfenas)