O presidente da Amagis, juiz Luiz Carlos Rezende e Santos, e o ex-secretário adjunto de Segurança Pública do Estado de Minas Gerais, professor Luís Flávio Sapori, lançaram nesta quarta-feira, 6/4, o livro “Tratamento Penitenciário – Um estudo sobre tortura, maus-tratos e assistência às pessoas privadas de liberdade”. O lançamento ocorreu no auditório da Corregedoria-Geral de Justiça do TJMG e foi prestigiado por magistrados e outras autoridades mineiras, além de amigos e familiares dos autores.
A publicação é editada pela Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef) do TJMG e conta com o apoio do Programa Novos Rumos, da Fraternidade Brasileira de Assistência aos Condenados (FBAC), do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e da Associação Voluntários para o Serviço Internacional – Brasil (AVSI) com recursos da União Europeia.
Diagnóstico e soluções
No lançamento, o juiz Luiz Carlos afirmou que o livro é um trabalho científico robusto que traz um retrato do sistema penitenciário brasileiro sobre o qual toda a sociedade precisa refletir. De acordo com o presidente da Amagis, a pesquisa alcançou uma grande camada de pessoas em privação de liberdade, que passaram mais de dois anos no regime fechado do sistema carcerário convencional e no regime fechado das Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (Apacs).
“É muito importante pensar no tratamento que as pessoas recebem, a partir daqueles que sentem, afinal a prisão é a segregação da liberdade. Portanto, ouvir quem está em privação de liberdade é fundamental para se delimitar políticas públicas. O livro não se trata de um trabalho-denúncia, mas sim de um retrato desse sistema”, destacou o juiz Luiz Carlos Rezende, que tem ampla atuação e experiência na área. Ele é diretor executivo do Programa Novos Rumos e presidente do Conselho de Administração da Fraternidade Brasileira de Assistência aos Condenados (FBAC), além de titular da Vara de Execuções Criminais de Belo Horizonte.
Durante o lançamento, o presidente da Amagis agradeceu a pessoas e instituições que apoiaram e tornaram possível a publicação da obra, em especial a seu pai, o juiz aposentado Fernando Humberto dos Santos, segundo ele, “sua grande fonte de inspiração”.
Os Miseráveis
De acordo com o juiz Luiz Carlos Rezende, durante todo o processo de execução da obra, ele se lembrava do livro “Os Miseráveis”, de Victor Hugo. “Esse é meu livro de cabeceira, e ficava na minha cabeça a figura do personagem do policial incorruptível, correto, que jurava que estava fazendo o melhor, e talvez estivesse mesmo, porque cumpria as regras. Eu vejo, muitas vezes, essa figura em excelentes pessoas que trabalham nessa lida da segurança pública, mas eu não gostaria que elas tivessem o mesmo fim da personagem de Victor Hugo. De, no final, descobrir que não era assim o indivíduo que ele estava a tentar recapturar e que precisava entender que aquela pessoa também tinha sentimentos”, afirmou.
O presidente da Amagis disse ainda que, por muitas vezes em sua vida, compartilhava com seu pai suas angústias com relação a alguma condenação imposta por ele a alguém. “E meu pai, muito carinhoso, dizia: ‘você tem que pensar sempre que, naquele momento, era assim que você achava estar fazendo o melhor. Você acreditava que aquela era a melhor decisão’. Durante muitos anos, eu me socorri diante disso, mas, depois do retrato que está aqui traduzido neste livro, eu não posso mais me socorrer. Eu tenho que suportar a minha responsabilidade de homem público. E tenho que transmitir isso aos meus pares. Tenho que levar isso aos demais e esperar que minha pena venha no juízo final”, finalizou.
Violência prisional
De acordo com o professor e sociólogo Luís Flávio Sapori, o objetivo do livro não é apenas diagnosticar as várias manifestações da violência no sistema prisional, mas também entender que fatores institucionais explicam a existência deste fenômeno que é muito pernicioso no cumprimento da pena na sociedade brasileira.
“É o estudo mais abrangente e detalhado já feito no Brasil sobre o fenômeno da violência prisional, que pode servir de base para aprimorar a ressocialização, que é o principal objetivo da pena de prisão”, afirmou Sapori.
O corregedor-geral de Justiça, desembargador Agostinho Gomes de Azevedo, destacou o apoio da Corregedoria a iniciativas que visem a melhoria do sistema prisional. “Enquanto corregedor-geral de Justiça, nós abrimos as portas para o tema penitenciário com o objetivo de aprimorar os atos normativos e possibilitar um fluxo maior, por exemplo, de criação de Apacs, que são importantíssimas para o sistema penitenciário e que efetivamente promovem a ressocialização. Quando se trata da Apac, Minas Gerais é referência para o Brasil. Portanto, parabenizo os autores deste livro, que será um marco para que possamos ler, comparar e fazer, cada um na sua área, o melhor”, afirmou o corregedor.
Referência
O diretor vice-presidente da Associação Voluntários para o Serviço Internacional – Brasil (AVSI), Jacopo Sabatiello, afirmou que o livro é um insumo científico que deve ser adotado por autoridades brasileiras para embasar diretrizes de políticas públicas e intervenções que, de fato, promovam os direitos das pessoas privadas de liberdade. “O resultado do livro é fruto de uma parceria intersetorial entre Judiciário, Ministério Público, sociedade civil e outras entidades. Portanto, esse é o tipo de trabalho que deve ser usado pelos entes públicos para traçar políticas penitenciárias efetivas”, destacou Sabatiello.
Veja aqui mais fotos do lançamento.
Mesa
Compuseram a mesa de honra do lançamento o presidente da Amagis, juiz Luiz Carlos Rezende e Santos, o ex-secretário adjunto de Segurança Pública do Estado de Minas Gerais, professor e sociólogo Luís Flávio Sapori; o 2º vice-presidente do TJMG e superintendente da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef), desembargador Tiago Pinto; o corregedor-geral de Justiça de Minas Gerais, desembargador Agostinho Gomes de Azevedo; o ex-presidente do TJMG e da Amagis desembargador Nelson Missias; o conselheiro e corregedor do Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCEMG), Durval Ângelo, representando o presidente do TCE-MG, conselheiro Mauri Torres; a secretária de Gestão Administrativa, Logística e Tecnologia Ana Luiza Falcão, representando o secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais, Rogério Grecco; o promotor de justiça e coordenador do Cento de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Criminais, Marcos Paulo de Souza Miranda, representando o procurador-geral, Jarbas Soares Júnior; a defensora pública Emília Eunice Castilho, representando o defensor público geral de Minas Gerais, Gério Patrocínio Soares; e o vice-presidente da Associação Voluntários para o Serviço Internacional - Brasil (AVSI), Jacopo Sabatiello.
O livro
O livro é um trabalho de estudo e reflexão e apresenta a preocupação dos autores, ambos estudiosos de política criminal e penitenciária, com o sistema carcerário brasileiro. A publicação apresenta uma pesquisa sobre os preceitos legais e constitucionais da Execução Penal.
O estudo traz entrevistas com 1.520 pessoas em cumprimento de pena que passaram pelo menos um ano no sistema comum e, quando entrevistadas, estavam no regime fechado da Associação para a Proteção e Assistência aos Condenados (Apac), além de comentar a experiência com as Apacs e a questão da mulher presa.
O estudo ainda apresenta, “em forma de denúncia, a dimensão necessária para se compreender a gravidade das circunstâncias a que são submetidas as pessoas que, privadas de sua liberdade, são também tolhidas de sua humanidade”, conforme descreve o ex-presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e da Amagis, desembargador Nelson Missias de Morais, no prefácio da obra.
A apresentação foi escrita pelo juiz Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), juiz auxiliar da presidência do Conselho Nacional de Justiça e coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas.
“Como está, o sistema prisional brasileiro opera e difunde a promoção cotidiana de atos atentatórios à dignidade humana, deixando de cumprir os requisitos mínimos estabelecidos pelas Nações Unidas para todo e qualquer regime de confinamento (as chamadas Regras de Nelson Mandela) no planeta”, destaca Lanfredi.