A previsão de bloqueio orçamentário feita pelo governo federal colocou em xeque o uso de urnas eletrônicas nas eleições municipais do ano que vem. Em portaria conjunta publicada ontem, os presidentes dos tribunais superiores do país alertam que o corte implicará na falta de verbas para aquisição dos aparelhos. As urnas passaram a ser usadas no Brasil em 1996. Três ex-presidentes do TSE ouvidos pelo Correio classificaram como um “grave retrocesso” a possível inviabilização do voto eletrônico.

O governo publicou ontem o decreto com a previsão do contingenciamento, com corte de R$ 1,74 bilhão no Orçamento do Poder Judiciário. Na última semana, o presidente do TSE, Dias Toffoli, procurou o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, para demonstrar a preocupação. Ontem, a portaria assinada por ambos e pelos comandantes de outros tribunais superiores afirma que o bloqueio imposto ao Judiciário, inclusive à Justiça Eleitoral, “inviabilizará as eleições de 2016 por meio eletrônico”.

Por falta de verba, eleições de 2016 serão manuais, diz portaria da Justiça
Só a Justiça Eleitoral, segundo a portaria, deixará de receber quase R$ 429 milhões. Em nota, o TSE explica que o corte afetará a aquisição e a manutenção de equipamentos necessários e uma série de outros projetos, incluindo a compra de urnas. Segundo a Corte, há um processo licitatório em curso, que necessita de contratação “imprescindível” até o fim de dezembro, “com o comprometimento de uma despesa estimada em R$ 200 milhões”.

“A demora ou a não conclusão do procedimento licitatório causará dano irreversível e irreparável à Justiça Eleitoral. As urnas que estão sendo licitadas têm prazo certo e improrrogável para que estejam em produção nos cartórios eleitorais. Na espécie, não há dúvida de que o interesse público envolvido há que prevalecer, ante a iminente ameaça de grave lesão à ordem, por comprometer as Eleições Eletrônicas Municipais de 2016”, diz a nota. Toffoli ainda disse que fará esforços junto ao Congresso Nacional “para que as verbas devidas sejam autorizadas, a fim de se garantir a normalidade das eleições do ano que vem”.

A aprovação da mudança na meta fiscal pode revogar o forte contingenciamento previsto pelo governo. A expectativa é que o projeto com a alteração seja votado nesta terça-feira ou amanhã. O governo está preocupado com a aprovação da proposta. A presidente Dilma Rousseff reúne-se nesta manhã com líderes da base para pedir esforço na matéria.

Presidente do Tribunal Superior Eleitoral à época do início implementação das urnas eletrônicas, em 1995, o ministro aposentado do STF Carlos Velloso classificou como “grave retrocesso” a volta do uso de cédulas de papel. “É muito grave e vai demandar ações do TSE. Essa improvisação certamente será danosa para o regime democrático.” Velloso ressaltou que o voto eletrônico reduziu a quantidade de violações que ocorriam durante o processo eleitoral e agilizou a apuração dos votos.

À frente do Tribunal Superior Eleitoral durante as primeiras eleições municipais em que as urnas foram usadas, em 1996, o ministro do STF Marco Aurélio Mello disse que o retrocesso “é impensável”. “A urna afasta o manuseio da cédula pelo homem, os desvios que houve no passado. O voto eletrônico é um sistema que deu certo no Brasil. Você tem uma votação rápida, a preservação da vontade do eleitor e a apuração em tempo recorde. É inimaginável voltar à cédula de papel. Seria um retrocesso.”

Vexame

Presidente da corte eleitoral por quatro vezes, o ministro aposentado Sepúlveda Pertence disse que é necessário que se envidem todos os esforços para não inviabilizar o uso das urnas no próximo ano. “É preocupante. Sobretudo nas eleições municipais, que são as mais suscetíveis a fraude. Seria um fracasso absoluto e um vexame internacional”, afirmou.

Além de Toffoli e Lewandowski, assinaram a portaria a presidente do Tribunal Superior Eleitoral; Laurita Vaz, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça; Antonio Levenhagen, presidente do Tribunal Superior do Trabalho; William de Oliveira Barros, presidente do Superior Tribunal Militar; e Getúlio de Moraes Oliveira, presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.

Fonte: Estado de Minas