O caso da jovem grávida que anunciou a doação do filho em um blog e deu entrada para a cesariana num hospital de Betim, na Grande BH, com documentos de uma advogada de Rondônia, que receberia a criança, mostra que a adoção à brasileira, mesmo contra a lei, não saiu de moda e ganha mais força com a internet. O delegado Tito Barichello, que anteontem prendeu em flagrante a empresária Eliane Azzi, suspeita de intermediar o tráfico de crianças, vai investigar a atuação de uma suposta quadrilha no blog querodoar.webnode.com.br. Nessa quinta-feira, ele pediu a prorrogação da prisão da acusada, que entrou com habeas corpus na Justiça.
Na rede social, o blog usado por Janaína Resende Carvalho, de 24 anos, virou fórum de discussão, inclusive com denúncias de pessoas que agenciam esse tipo de negociação. Os depoimentos mostram mães biológicas querendo doar filhos, normalmente alegando falta de condições financeiras, e famílias à procura de crianças. Há quem peça uma "ajuda de custo", mas a repercussão da prisão da empresária Eliane fez o administrador lançar um alerta, informando ser crime oferecer ou adotar criança em troca de dinheiro ou sem passar pelo Juizado da Infância e Juventude.
No blog, o administrador diz que o espaço foi criado para doar "coisas" e não vidas. Mas os posts que seguem são de mulheres que querem entregar os filhos, ainda em gestação ou mesmo crescidos, e muitas que querem adotar. Ontem, mesmo diante da divulgação do caso de Betim, uma mulher pedia informações se alguma mãe biológica no Rio de Janeiro tinha interesse em doar uma criança de até 2 anos. Em outro caso, uma moça escreve: "Olha, dói muito dar minha menina, mas que opção eu tenho, aluguel atrasado, pelo menos ela terá um lar e eu vou poder arrumar um serviço". Uma mulher responde: "Eu te ajudo no que for preciso em troca do bebê".
Muitas não deixam nomes, enquanto outras deixam na página telefones pessoais e e-mails para contato. "Entrem em contato comigo, mamães. Não façam aborto", diz uma mulher. "Quero doar minha filha que amo muito, estou triste com a decisão, mas não sei o que fazer", diz outra mulher. Uma terceira responde: "Me liga", deixando seu contato.
CADEIA O advogado da assessoria jurídica do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam) Ronner Botelho alerta sobre as negociações no site. Segundo ele, o Código Penal considera crime registrar o filho de outra pessoa, ocultar recém-nascido ou substituí-lo, dar parto alheio como próprio, abandonar o incapaz e deixá-lo exposto ao risco. Todas com pena de prisão. Se envolver dinheiro, mesmo que seja por ajuda de custo, como mulheres oferecem no site, o juiz pode decidir aumento da pena. "O grande problema do site é que o processo de adoção tem de passar pelo Judiciário, com participação das as partes, do Ministério Público, e o interessado deve estar habilitado", explicou. Disse que manifestar o desejo de doar, mesmo pela internet, não é crime. Mas a situação se complica quando começa uma negociação.
Eliane foi presa no Hospital Regional de Betim, pressionando médicos e enfermeiros a liberar logo o bebê. Ela se apresentou como amiga de Janaína, a mãe da criança, e deu a ela documentos falsos em nome de Selena Castiel Gualberto, advogada de Rondônia, com quem Janaína fez os contatos pelo blog. Segundo a jovem que deixou o hospital e o bebê para doação, aos quatro meses de gravidez ela colocou um anúncio no blog e recebeu mais de 100 mensagens. A jovem morou três meses na casa da empresária, na Região da Pampulha, em BH, até dar à luz. O delegado Tito Barichello diz que se trata de uma quadrilha suspeita de tráfico de crianças e pediu a apresentação da advogada. No escritório em Rondônia, a informação é de que ela estava viajando.
Fonte: Estado de Minas
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