Enquanto pipocam "soluções simples" para resolver todos os problemas do país, como reduzir a maioridade penal e decretar a prisão de réus antes do trânsito em julgado, o advogado Andre Kehdi é taxativo a dizer que não adianta retirar direitos dos cidadãos se continuarmos com o mesmo sistema de Justiça, que cada vez mais acumula processos, e com nosso já antigo modelo penal, que parece ter criado um perfil específico de culpados, enchendo as cadeias de com as pessoas que se encaixam no estereótipo.
Presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), ele defende que combater o mero punitivismo é a principal missão da entidade, criada em 1992 para promover debates, produzir pesquisa e reunir profissionais de várias áreas do conhecimento. “Não existe uma relação direta, necessária e comprovada entre aumento da punição (...) e redução da criminalidade”, afirma. “Fazemos um contraponto a cada pauta fundamentalista e injustificada que surge, esse é o motivo de o IBCCrim existir.”
O trabalho fica agora maior com as recentes propostas em andamento no Legislativo. “Hoje, o Congresso finalmente tem autonomia, mas está usando esse poder contra direitos individuais e sociais”, afirma Kehdi, que ainda assim aponta um saldo positivo dos últimos anos, quando avalia a valorização dos direitos humanos.
Uma das iniciativas elogiadas por ele é a implantação das audiências de custódia, medida desenhada pelo Conselho Nacional de Justiça para ouvir presos em flagrante em no máximo 24 horas. Apesar da torcida para que o projeto se espalhe pelo país, Kehdi faz críticas ao que é desenvolvido em São Paulo — tem receio de que gravações das audiências sejam usadas como colheita antecipada de prova e que eventuais casos de torturas policiais não sejam relatados quando PMs estão perto do suspeito.
Em visita à redação da revista eletrônica Consultor Jurídico, o presidente do IBCCrim demonstra ainda preocupação com o crescimento das delações premiadas quando o acusado está preso (e hipossuficiente), explica por que motivo é favorável à descriminalização das drogas e defende que advogados façam pro bono, ou seja, trabalhem de graça em prol de causas que acreditam.
Sócio-fundador do escritório Andre Kehdi e Renato Vieira Advogados, formou-se em Direito pela PUC-SP, em 2003, é especialista em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra (em parceria com o IBCCrim) e foi diretor jurídico do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD). Também coube a Kehdi o cargo de 1º vice-presidente do Conselho Consultivo da Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública do estado de São Paulo de 2011 a 2015.