Na contramão do aperfeiçoamento do Judiciário e da prestação jurisdicional, está em curso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um movimento destinado ao enfraquecimento da Justiça Eleitoral, por meio da extinção de inúmeras zonas eleitorais espalhadas pelo Brasil.
Aprovada pelo TSE, a Resolução de nº 23.512/2017, de 16 de março de 2017, impõe o rezoneamento eleitoral sob o argumento de economia de gastos. De acordo com seu teor, cada zona eleitoral, para ser mantida ou criada, terá que ter, no mínimo, 100 mil eleitores e, no máximo, 200 mil, incluindo as capitais dos estados.
São modificações que irão impactar todas as regiões do País, especialmente em um estado de dimensões continentais como Minas Gerais, onde mais de 70% de seus 853 municípios têm menos de 10 mil eleitores. O fechamento de zonas eleitorais prejudicará, irreversivelmente, o atendimento de qualidade nos municípios, embaraçando o exercício de direitos fundamentais de natureza política e ameaçando a eficiência, a qualidade e a confiabilidade da Justiça Eleitoral.
São medidas que, direta e indiretamente, irão restringir o acesso do cidadão, que, por conta da extinção, terá que se deslocar muito para encontrar a unidade de atendimento mais próxima, para fazer seu título e votar. Junto da redução do atendimento a quem mais necessita desses serviços, a própria segurança das eleições ficará em xeque. Na maioria dos municípios, como é sabido, existem históricas divergências durante as eleições, condições que encontram na presença do juiz e do membro do Ministério Público fator de equilíbrio importante na pacificação desses conflitos.
Em função das peculiaridades de cada região do Brasil, de Norte a Sul, não se pode inovar, sobretudo em ano que antecede a nova disputa política nacional, sem um amplo debate com os Tribunais regionais e associações de defesa dos municípios. Construída de cima para baixo, a resolução viola também o princípio da hierarquia administrativa, quando a Presidência do TSE determina a realização de reorganização da jurisdição de primeiro grau sem que os Tribunais regionais fossem consultados ou tivessem participado das discussões.
Há muito, é de reconhecimento de todos, dentro e fora do Brasil, a eficiência da Justiça Eleitoral, em especial o sucesso do sistema eletrônico de votação, a coleta biométrica de dados dos eleitores e a evolução da integração dos sistemas de controle das prestações de contas. A Justiça Eleitoral é isenta, fortalece a democracia e garante a lisura das eleições. Ainda assim, está sendo alvo de ação que visa enfraquecê-la a partir da extinção de zonas eleitorais. Ao contrário, o funcionamento e a trajetória exitosa dessa Justiça especializada estão intimamente ligados à capilaridade da sua estruturação, alcançando todo o território nacional.
Por conta dessas reconhecidas competências, a Justiça Eleitoral ainda ganhou outra ao ser convocada para assumir a gestão do cadastro da Identificação Civil Nacional, que instituiu, em maio deste ano, a unificação dos documentos de identificação usados no Brasil.
Contra essa grave ação do TSE, que afeta o modelo de Justiça Eleitoral, construído e consolidado pela Justiça Estadual desde a redemocratização em 1985, defendemos maior análise e diálogo entre a sociedade e as instituições envolvidas com a Justiça Eleitoral, para avaliar as mudanças sem afetar o acesso do cidadão, a qualidade no atendimento e a segurança das eleições.
Desembargador Maurício Soares
Presidente da Amagis
Artigo publicado no site Consultor Jurídico no dia 14 de junho de 2017 e no jornal O Tempo no dia 18 de junho de 2017