Matéria Tecnologia

Até o final deste ano, quase metade da população mundial estará usando a internet, de acordo com relatório da União Internacional de Telecomunicações (ITU, na sigla em inglês) da ONU, divulgado em novembro. Para acompanhar essa evolução, a modernização tecnológica do Poder Judiciário se faz ainda mais necessária, com o emprego de um número cada vez maior de recursos inovadores e sistemas interligados.

Na Comarca de Pará de Minas (Oeste), aplicativos como WhatsApp e Telegram vêm sendo utilizados não só para a troca de experiências e intercâmbio profissional, mas também para decisões judiciais em medidas urgentes.

O juiz Pedro Camara Raposo Lopes, da Vara de Execuções Criminais, da Infância e da Juventude e de Precatórias Criminais de Pará de Minas, cita o caso de um reeducando que se achava em cumprimento de pena na Penitenciária Dr. Pio Canedo, atualmente no regime semiaberto, e requereu autorização para se submeter ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2016.

O reeducando devia ficar recolhido durante os finais de semana, e como os autos do processo haviam acabado de chegar do Ministério Público, sem conclusão, o juiz recebeu o pedido da unidade jurisdicional durante seu plantão. Como já era sábado, próximo do horário da realização do Enem, o magistrado digitou sua decisão no aplicativo de mensagem instantânea WhatsApp e a encaminhou para a unidade prisional, onde foi impressa, valendo como salvo-conduto. Assim, o reeducando pôde comparecer ao exame.

Segundo o juiz Pedro Camara Raposo, está também em fase de implantação na comarca a utilização do WhatsApp por parte de mulheres que tenham sido vítimas de violência doméstica, que passariam a ter um contato para o caso de o agressor violar as medidas protetivas da Lei Maria da Penha.

De acordo com o magistrado, dessa forma poderão ser evitadas ocorrências graves. “Numa situação de emergência, a ofendida dispararia uma mensagem simples para o número disponibilizado, acionando simultaneamente a Polícia Militar, para que compareça ao local, debelando a situação de crise, a Polícia Civil e o Judiciário que, caso positivada a ocorrência pela PM, poderá decretar a prisão preventiva e encaminhar a decisão respectiva para imediato cumprimento”, contou.

A implantação está em fase de concepção do fluxo de informações, a fim de evitar redundâncias e falhas que comprometam a celeridade que se visa buscar.

Intimações

A escrivã do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) Fernanda Saliba tem realizado intimações via WhatsApp e, desde então, tem recebido por despachos determinações para intimação das partes via telefone e pelo aplicativo.

“Neste ano, por volta do mês de abril, fiz a primeira intimação por WhatsApp. A intimação do réu promovido tinha retornado cumprida e a do autor promovente, não. Como não daria tempo para expedir mandado ou carta de intimação e o telefone informado no processo não atendia, cadastrei o número do celular informado no processo, enviei a mensagem informando a data e o horário para audiência. Com a comprovação da leitura, copiei a tela e juntei ao processo. A parte compareceu e a audiência foi realizada com sucesso”, contou a escrivã.

Gravação de audiências

Para 2017, uma das metas do TJMG é iniciar a segunda fase do projeto Gravação de Audiências, com a expansão para as unidades judiciais da área criminal de todo o Estado. Em outubro deste ano, o Tribunal iniciou processo licitatório para compra de software e serviços necessários às gravações.

O sistema prevê a gravação audiovisual das declarações prestadas em audiências judiciais. Assim, em vez de as declarações serem ditadas pelo magistrado ao escrevente, tudo é gravado em mídia digital, o que agiliza as audiências. O sistema permite fazer marcações em partes importantes da gravação, que poderão ser consultadas pelo magistrado, posteriormente, de forma mais rápida.

A juíza titular da 2ª Vara de Tóxicos de Belo Horizonte, Andréa Miranda Costa, faz uso dessa ferramenta desde novembro de 2014. Na época, utilizava equipamento adquirido com recursos próprios. De lá para cá, já com equipamento fornecido pelo Tribunal, o número de audiências realizadas por mês saltou de 65 para 140, em média.

Entre as vantagens do sistema, a magistrada destaca o fim da necessidade de resumir as oitivas das testemunhas e os interrogatórios e o fato de o julgador em segundo grau ficar mais próximo da prova produzida, o que facilita o julgamento. “O juiz, como operador do direito, conhece os atalhos que uma nova ferramenta traz. Todo esse aparato tecnológico agiliza – e muito – a prestação jurisdicional”, disse Andréa Miranda Costa.

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Mandado de prisão eletrônico

No final do mês de novembro, o TJMG implantou, em caráter experimental, o mandado de prisão eletrônico nas três Varas de Tóxicos de Belo Horizonte. A partir de agora, dada a ordem nos autos pelo magistrado, o mandado de prisão será expedido diretamente no sistema RUPE/BEMP, usado pelo Tribunal, e assinado digitalmente pelo juiz. O destaque dessa implantação é que o sistema usado pelo TJMG será interligado ao sistema da Polícia Civil mineira, agilizando de forma expressiva a comunicação das prisões. Além disso, a secretaria da Vara não mais fará a alimentação manual do BEMP/BNMP após efetivada a captura do indivíduo.

“Esse projeto experimental trará não só a diminuição significativa de trabalho das secretarias judiciais, mas a segurança da assinatura digital nos mandados de prisão expedidos e, principalmente, a agilidade da comunicação à polícia. Esses detalhes, aliados à informatização e interligação dos sistemas, tornam a justiça mais célere e confiável”, afirmou a juíza Andréa Miranda Costa.

Conciliação

Na Central de Conciliação de Belo Horizonte, está em curso a validação de um sistema de informática para o pré-processual que permitirá expandir esse setor do CEJUSC/BH para outros parceiros. De acordo com o coordenador da Central, juiz Renan Carreira Machado, já houve uma reunião com coordenadores de 22 faculdades de Direito de Belo Horizonte para implantar um posto avançado do CEJUSC/BH em cada uma delas e atuar juntamente com os respectivos núcleos de prática jurídica.

O sistema permitirá o agendamento, processamento e armazenamento das sessões de conciliação pré-processuais, de modo simplificado, além de possibilitar o gerenciamento e o controle estatístico. Com isso, será possível superar os conflitos sem judicializá-los, contribuindo para a redução do acervo processual. “Mas não é só. O projeto fomentará também a pacificação e estimulará a mudança de paradigma, com a superação da cultura do litígio”, destacou Renan Carreira Machado.

Quebra de paradigmas

Para o advogado e ex-desembargador do TJMG Fernando Botelho, as novas tecnologias, como as redes sociais, e o conceito ultrainovador da segurança criptográfica da informação trouxeram uma revolução, não só nos costumes, mas nos instrumentos de trabalho do juiz e na realidade dos processos. De acordo com ele, essas novas realidades, menos formalistas e estáticas que o papel, são hoje desafios para o trabalho do Judiciário, que precisa estar ambientado, por magistrados e servidores, em um conceito mais amplo de Justiça. “Não se faz isso, claro, sem sacrifícios institucionais e profissionais-pessoais. O processo eletrônico é um sacrifício necessário, como repositório dessa amplitude de provas. E a modernização dos critérios investigativos e do conhecimento dos fatos constitui outro ônus que a modernidade impõe”, observou. Leia entrevista ao lado

A juíza Andréa Miranda Costa defende a ideia de que apenas a tecnologia encurta caminhos e quebra paradigmas. “O Judiciário deve se pautar pela presteza exigida pelo jurisdicionado. E pensar nisso, sem o uso da tecnologia, é impossível. É evidente que outras medidas de cunho pessoal e legal podem ser adotadas, mas sem o amparo da tecnologia, ficam rapidamente superadas”, afirmou.