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Regulamentação para audiência entre juiz e advogado divide opiniões
31/07/2014 15h43 - Atualizado em 09/05/2018 16h00
A definição de regras para que advogados sejam recebidos por juízes está longe de ser uma unanimidade. Elogiado pelo ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, o Projeto de Lei que busca regulamentar as audiências é considerado por muitos uma burocracia desnecessária.
Proposto pelo deputado Camilo Cola (PMDB-ES), o Projeto de Lei 6.732/13 tramita na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. O PL altera o Código de Processo Civil e o Estatuto da Advocacia para regulamentar as audiências entre magistrados e advogados para tratar de causas em tramitação nos tribunais.
Para o parlamentar, os encontros informais favorecem o estabelecimento de "práticas espúrias" e contribuem "para emperrar as engrenagens da Justiça, na medida em que submetem juízes assoberbados ao bel-prazer dos advogados" — atualmente os juízes costuma receber os advogados sem agendamento prévio
Segundo o deputado, seu objetivo é acabar com os chamados “embargos auriculares”, em que os advogados tentam influenciar os magistrados com conversas. O deputado cita ainda o “filhotismo”, como ficou conhecida a influência que advogados com laços familiares de magistrados exercem sobre algumas causas, prática denunciada pela ex-corregedora do CNJ Eliana Calmon. Também citou o conluio entre advogados e juízes, apontados pelo ministro Joaquim Barbosa durante uma sessão do CNJ.
Atualmente, o modo como o juiz deve receber o advogado está previsto no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94) e na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman - LC 35⁄79). De acordo com o artigo 7º, inciso VII, do Estatuto da Advocacia, é direito do advogado “dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada”.
Já a Loman determina (artigo 35, inciso IV) como obrigação do magistrado "tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quando se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência".
Burocracia desnecessária
Para o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Paulo Schmidt (foto), o projeto é absurdo e cria uma burocracia desnecessária. “É legislar em cima da exceção que é o tráfico de influência. Há poucas queixas a respeito desse problema. O que se pretende é burocratizar uma relação que deve ser cotidiana, de contato fácil”, afirma.
De acordo com ele, a medida apenas irá dificultar o contato entre o advogado e o juiz que hoje ocorre com naturalidade. “O juiz de primeiro grau, que já está assoberbado, precisará abrir mais um espaço na agenda para receber o advogado. Isso sem contar que precisará encontrar um horário que atenda a todos. Esse projeto é uma inutilidade”, completa.
O advogado Roberto Cardillo, do Cardillo & Prado Rossi Advogados, também critica o projeto de lei. “O projeto de alteração do CPC e do Estatuto do Advogado constitui mais uma das doses diárias de sandices com que somos, de tempos a tempos, brindados. Pretende-se instituir um inútil contencioso”, diz. Para Cardillo, o projeto que busca um efeito moralizante irá cercear e dificultar o exercício da advocacia. Segundo ele, não se pode presumir má-fé do advogado ao se encontrar com um juiz e, nos casos em que há abuso, há existem sanções na legislação vigente.
Franco Mauro Russo Brugioni, do Raeffray Brugioni Advogados, reforça o coro contrário ao projeto. Para ele, trata-se da criação de mais uma dificuldade à atuação do advogado. “A justificativa de se tentar combater uma situação específica não é suficiente para que se prejudique a grande maioria de casos e de advogados. Este tipo de proposição retrata um completo desconhecimento da realidade”, diz. Segundo ele, se a ideia é combater a suposta prática de conluio, não será esta burocracia que irá resolver o problema.
“Se está simplesmente tentando criar algo que deixará os processos ainda mais lentos. E mesmo com a implantação do processo eletrônico, ainda em andamento, o acesso ao Poder Judiciário, a conversa pessoal com o juiz, o desembargador, o ministro é primordial para que o advogado possa chamar a atenção para os contornos de cada caso, lembrando que os juízes têm milhares de processos para examinar e julgar e por conta disso algum detalhe pode passar batido”, complementa.
A necessidade de agendamento desagradou também a seccional gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil. "Não podemos aceitar o retrocesso, pois já registramos muitos casos de violações às prerrogativas, mesmo com garantias em lei”, disse o presidente da OAB-RS, Marcelo Bertoluci. Ele encaminhou um pedido para que o Conselho Federal da OAB se posicione contra o PL.
Regulamentação positiva
A proposta do deputado Camilo Cola foi elogiada pelo ministro Joaquim Barbosa. Pelo twitter, o ministro considerou o projeto um primeiro passo positivo e afirmou que abordará o tema no futuro, em um momento oportuno.
O desembargador federal Aluisio Mendes, coordenador da comissão da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) para a reforma do CPC, considera salutar a discussão, mas lembra que o PL, se aprovado, poderá ser ineficaz em breve, uma vez que tramita no Congresso Nacional um novo Código de Processo Civil que inclusive trata do assunto.
O artigo 190 do projeto do novo CPC diz que o juiz ou relator determinará que seja publicidade ao comparecimento informa, junto a ele, de qualquer das partes ou seus representantes judiciais, ordenando o imediato registro nos autos.
Mesmo considerando salutar a iniciativa do deputado, Mendes diz que é preciso debater melhor o tema com todos os envolvidos para que seja definida a melhor maneira de dar a transparência desejada. "Talvez seja melhor uma orientação do CNJ, dos tribunais, do que uma imposição de cima para baixo por força de lei. No Brasil há o costume de pensar uma lei com base em uma experiência, mas sem levar em consideração a realidade do resto do país. Há lugares que o juiz nem secretária possui. Não podemos criar uma lei que torne tudo mais burocrático e que atrapalhe o desempenho da Justiça", diz.
Para o presidente da Associação dos Magistrados do Maranhão (AMMA), Gervásio dos Santos (foto), a regulamentação da visita de advogados aos gabinetes dos magistrados é positiva pois irá garantir a paridade de armas e evitar conflitos. “Hoje, não há nenhum critério, o que propicia a ocorrência de episódios lamentáveis, tais como advogados que interrompem audiências buscando atendimento ou mesmo, sob a justificativa de que possuem livre acesso a todas dependências da unidade judicial, recusam-se a submeter a comezinhas regras de atendimento, gerando conflitos desnecessários”, diz.
Confusão
Recentemente, no Maranhão, um advogado e um juiz foram parar na delegacia após uma confusão no Fórum Desembargador Sarney Costa. De acordo com a AMMA, um advogado teria se dirigido à sala de audiências para obter informações sobre um processo, sem haver procurado o balcão de atendimento da Secretaria Judicial para fazer sua solicitação. Para ser atendido ele teria esmurrado a porta várias vezes e, ao se dirigir ao juiz, o agredido com empurrões e palavras de baixo calão.
Ao portal G1, o advogado contou que a confusão começou quando ele tentava buscar informação sobre um processo e encontrou a sala do juiz fechada. Ele narra que bateu na porta por 30 minutos até alguém atendê-lo e mandá-lo se anunciar na secretaria. O advogado respondeu que não precisaria se anunciar e se encaminhou até o juiz. Segundo ele, neste momento o magistrado o recebeu com empurrão. Após a troca de empurrões o juiz deu voz de prisão e ambos foram para a delegacia.
Devido a este episódio, a AMMA fez um requerimento ao Tribunal de Justiça do Maranhão pedindo que o tribunal regulamente o acesso de advogados às dependências das unidades jurisdicionais. No requerimento, a associação argumenta que a matéria foi discutida pelo Conselho Nacional de Justiça nos autos do Procedimento de Controle Administrativo 0004336-23.2013.2.00.0000, no qual o relator, Conselheiro Rubens Curado, afirmou que o direito de livre ingresso e circulação no âmbito interno das unidades judiciárias deve ser compatibilizado com a necessidade de manter a ordem, a segurança e a regular administração dos serviços judiciários.
A Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) não se manifestaram. A OAB informou que irá levar o projeto para discussão na próxima sessão do Conselho Federal. Já a AMB informou que está discutindo o projeto para então definir um posicionamento institucional.
Fonte; Conjur