* Desembargador Herbert Carneiro (4ª Câmara Criminal do TJMG)

A política pública de penas alternativas no Brasil, desde 2000, ganhou força com o surgimento de um programa nacional específico voltado para a difusão de sua aplicação, valendo-se, para tanto, de recursos oriundos do Fundo Penitenciário Nacional. Em 2002, no Ministério da Justiça, foi criada a Comissão Nacional de Apoio às Penas e Medidas Alternativas (CONAPA), com o propósito de produzir e difundir conhecimento acerca da sua execução; identificação, avaliação e fomento de boas práticas na área das alternativas penais.

Não bastasse isso, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça, em 2007, baixou a Resolução nº 5, que tem por objetivo assegurar, quando da elaboração do orçamento anual do Departamento Penitenciário Nacional, verba no mínimo igual à relativa ao custo total de construção de uma unidade prisional federal ( de vinte e cinco milhões de reais mais ou menos), para os programas direcionados ao apoio, fomento e fiscalização das penas e medidas alternativas. Todo esse esforço institucional é refletido no expressivo número de cidadãos que cumprem penas alternativas no Brasil atualmente, 600.000 aproximadamente, o que vale dizer que elas já se tornaram uma realidade na cultura jurídica nacional.

Em Minas Gerais, a realidade das alternativas penais é concretizada, com bons resultados, através das Ceapas (Centrais de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas), que trabalham com uma metodologia qualificada de acolhimento, encaminhamento e acompanhamento dos indivíduos que cumprem penas alternativas; buscam resgatar o caráter ressocializador da pena, através da criação, implantação e execução de projetos que trabalham a promoção da cidadania, visando a diminuição da reincidência criminal. Somente em 2009, mais de 10.000 cidadãos foram encaminhados para cumprimento de penas alternativas, com índices de menos de 10% de descumprimento, o que revela o sucesso dessa política pública em nosso Estado.

Ainda no cenário nacional, merece destaque a ação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que, especificamente sobre as penas e medidas alternativas, fez editar a Resolução nº 101, de 25/01/2010, da qual consta, para os Tribunais do país, entre outras recomendações, a criação de varas especializadas em execução de penas e medidas alternativas; de centrais de acompanhamento e núcleos de monitoramento vinculados aos juízos competentes para as alternativas penais; de um modelo descentralizado de monitoramento psicosocial, feito por equipe multidisciplinar; e de um cadastro único de penas e medidas alternativas, sob a supervisão das corregedorias dos tribunais.

Na contramão de toda essa histórica trajetória de sucesso das penas e medidas alternativas no Brasil, o Congresso Nacional aprovou recentemente o Projeto de lei nº 273, de 2009, que trata da possibilidade de utilização de equipamento de monitoração eletrônica de apenados, e, absurdamente, em seu artigo 146 B, inciso III, diz que o juiz pode definir o uso desse equipamento inclusive em cidadãos apenados com pena restritiva de direito que estabeleça limitação de horários ou da frequência a determinados lugares. Neste particular, é preciso estar atento, pois, tal previsão – se concretizada – colocará por terra toda política pública desenvolvida em prol das penas alternativas, especialmente se considerarmos que a fiscalização do cumprimento desta modalidade de penas tem por fundamento maior o pacto de confiança firmado entre o cidadão apenado, a ser humanamente monitorado, os operadores do direito e a sociedade civil, cada um na seara de sua responsabilidade.

Destarte, imperiosa manifestação, de caráter nacional, a fim de sensibilizar o senhor Presidente da República, para vetar o referido Projeto de lei, especialmente na parte que diz respeito à previsão de monitoramento eletrônico para apenados sujeitos às penas restritivas de direito, porque, neste caso, o apenado é o primeiro a ser conscientizado, por equipe interdisciplinar, sobre a necessidade de cumprir a pena imposta e, mais ainda, da oportunidade humanizada que tem de fazê-lo sem experimentar as mazelas do cárcere. A partir daí, o próprio apenado, os operadores do direito e a sociedade civil, imbuídos do propósito ressocializador da pena alternativa, passam a ser garantidores de seu efetivo cumprimento, fazendo valer apenas seu monitoramento humanizado, sem necessidade do patrulhamento eletrônico.

* Este artigo foi publicado no jornal Estado de Minas, editoria de Opinião, edição desta terça-feira, 08 de junho de 2010.

O desembargador Herbert Carneiro, da 4ª Câmara Criminal do TJMG, é vice-presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e vice-presidente Administrativo da Associação dos Magistrados Mineiros (Amagis)