Está previsto para ser julgado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça nesta quarta-feira (7/5) se gravação clandestina feita por um dos participantes da conversa é válida como prova para a abertura de uma Ação Penal ou apenas como instrumento de defesa. Está na pauta da próxima sessão a análise de denúncia oferecida com base na operação caixa de pandora, que levantou acusações de um suposto mensalão do DEM durante a administração do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda.

Só ficou no STJ a acusação contra Domingos Lamoglia, conselheiro do Tribunal de Contas do Distrito Federal. Como Arruda e outras autoridades denunciadas já deixaram seus cargos ou foram cassados, o processo foi desmembrado em junho de 2013. Na 7ª Vara Criminal de Brasília, foi aceita denúncia contra 19 pessoas em abril deste ano. Agora é a vez da Corte Especial analisar o caso de Lamoglia. A defesa dele, no entanto, tenta adiar a apreciação do tema.

As investigações basearam-se em gravações feitas por Durval Barbosa, ex-secretário de Arruda. Já é pacífico o entendimento de que gravações escondidas são lícitas no processo quando feitas por um dos interlocutores — diferentemente dos casos que envolvem um terceiro, sem conhecimento dos demais. Mas o advogado Pierpaolo Cruz Bottini, um dos defensores de Lamoglia, aponta um precedente da Corte Especial que recusou esse tipo de material por não ver comprovadas ameaças (a chamada investida criminosa) contra o autor da gravação.

No julgamento da Ação Penal 479, em 2007, os ministros rejeitaram por unanimidade denúncia contra um desembargador do Rio de Janeiro acusado de ter cobrado propina de um empresário para conceder decisões favoráveis a ele. O empresário captou uma conversa durante visita à casa do magistrado, mas a defesa alegou que o material só deveria ser admitido se fosse usado para o autor da gravação se defender. A corte considerou que o material não demonstrava a investida criminosa e, portanto, seu uso violaria a privacidade do outro participante.

Ressalvas
Dois advogados criminalistas consultados pela revista Consultor Jurídico afirmam que a jurisprudência do STJ e do Supremo Tribunal Federal aceitam as gravações ilícitas como prova nas denúncias, mas apontam ressalvas. “A partir do momento em que se considera a prova lícita, ela pode ser usada tanto pela defesa como pelo Ministério Público”, diz Alberto Zacharias Toron. “Precisamos ponderar que a conversa, por si só, não é prova de nada. Se em uma gravação uma pessoa diz ter matado outra, isso não é prova de crime. É preciso encontrar o corpo, verificar a materialidade.”

Guilherme San Juan Araujo aponta voto vencido do ministro do STF Menezes Direito (morto em 2009) contra o uso de gravações, a não ser em casos excepcionais, para evitar a invasão absoluta da privacidade — como julgado na AP 447. “Apesar da jurisprudência, no meu entender, a Constituição não protege a clandestinidade, aquele que quer produzir a prova a fórceps, a qualquer custo. Para preservar o direito fundamental à privacidade, deve-se enxergar esse tipo de prova com enorme reserva”, diz Araujo.

Até o Ministério Público Federal já afirmou argumento parecido em ao menos um caso julgado em 2009 pelo Supremo. No Recurso Extraordinário 402.717, a Procuradoria-Geral da República disse que a “gravação clandestina de conversas, sem o consentimento do interlocutor, e que visa não apenas fazer prova em favor do investigado, mas também incriminar terceiros viola a garantia processual de proteção à intimidade, a qual somente pode ser afastada por autorização judicial”. Os argumentos foram rejeitados pela 2ª Turma.

Fonte: Conjur