O Tribunal de Justiça de São Paulo quebrou um tabu que sobrevivia há pelo menos duas décadas na maior corte do país. Nesta quarta-feira (7/4), o Órgão Especial proibiu a convocação de juízes assessores por prazo superior a quatro anos e mandou para as varas e câmaras de origem todos os magistrados convocados para cargos de direção e de cúpula que estavam em desacordo com essa regra. A proibição é prevista no novo Regimento Interno do TJ, aprovado no ano passado, e na Resolução nº 72 do Conselho Nacional de Justiça.
Antes de passar pelo crivo do Órgão Especial, o tema foi discutido no Conselho Superior da Magistratura. Nesse colegiado, a manutenção dos juízes que excediam o prazo de permanência no cargo obteve a quase unanimidade. Houve apenas um voto divergente, do presidente da Seção de Direito Privado, desembargador Maia da Cunha. Os argumentos apresentados no voto vencido da sessão do Conselho foram citados na reunião do Órgão Especial. Procurado pela revista Consultor Jurídico, o desembargador Maia da Cunha se negou a comentar o assunto.
“Essa limitação nunca foi aplicada no Tribunal de Justiça de São Paulo”, defendeu o desembargador Viana Santos, presidente do TJ paulista, antes de passar a direção do julgamento no Órgão Especial para o vice-presidente, Marco César. “O Tribunal de Justiça precisa cumprir e aplicar a lei”, contestou o desembargador Ivan Sartori. Para ele, é inadmissível perpetuar o quadro irregular de juízes assessores, em defesa do que chamou de princípio de autogoverno na maior corte do país.
Sartori defendeu que a falta de renovação nas funções de assessoramento dos cargos de cúpula e direção além de contrariar o Regimento Interno, afasta o juiz de sua função precípua, que é a de judicar. “Sabemos da situação caótica que vive a primeira instância, abarrotada de processos que aguardam a solução de litígios. A volta dos juízes vai melhorar esse quadro”, disse Sartori.
O voto do desembargador Ivan Sartori, no sentido de tornar sem efeito as convocações de todos os magistrados designados no Tribunal de Justiça, com mais de quatro anos de exercício nessa função, prevaleceu pelo placar de 16 a 8. Ficaram vencidos os desembargadores Marco César, Munhoz Soares, Reis Kuntz, Sousa Lima, Barreto Fonseca, José Reynaldo, Ribeiro dos Santos e Cauduro Padin. Este último defendeu que fosse concedido prazo de 180 dias para se efetivar a mudança.
Pelo menos quatro juízes (Álvaro Augusto dos Passos, Homero Maion, Inah de Lemos e Silva Machado e Alexandre Augusto Pinto Moreira Marcondes), que atuavam nas assessorias, serão desconvocados por não estarem de acordo com o que disciplina o Regimento Interno. O primeiro é juíz substituto de segundo grau e voltará a atuar na câmara para a qual foi designado. Os outros voltarão para as varas de origem. Todos irão desempenhar a atividade de julgar.
Hoje, o Tribunal de Justiça mantém 40 juízes como assessores da cúpula (presidência, vice-presidência e corregedoria) e da direção (seções de direito privado, público e criminal). O quadro de assessores é assim dividido: 10 juízes prestam serviço na presidência, três na vice-presidência, três na Seção Criminal, quatro na Seção de Direito Privado, três na Seção de Direito Público e 17 na Corregedoria Geral da Justiça. Os juízes assessores não recebem vencimentos a mais por conta do cargo que ocupam.
Na gestão anterior, o quadro chegou a ser pior. Pelo menos sete juízes estavam em desacordo com o antigo Regimento Interno, que fixava como limite o prazo de três anos no cargo de juízes assessores. Os juízes Ana Amazonas Barroso Carrieri (então assessora da presidência), Afonso Celso da Silva (da Seção Criminal) e José Roberto Furquim Cabella (da Corregedoria) estavam no cargo há dez anos. Em novembro de 2007, a direção do tribunal mantinha 21 juízes trabalhando como assessores além do prazo regimental. Esse quadro foi reduzido a um terço nos dois anos seguintes.
Juiz sem vara
Em fevereiro, o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, afirmou que a lei não pode fazer de um juiz um auxiliar, um assessor de quem quer que seja. O argumento foi usado para negar autorização ao TRF da 1ª Região, que pretendia convocar juízes de primeira instância. Segundo o ministro, a situação criava um juiz sem vara, à margem da atuação que lhe é própria, deslocado de suas funções e ausente. “É como descobrir um santo para cobrir outro”, disse Marco Aurélio, na ocasião.
Para o ministro, a sobrecarga de trabalho deve ser resolvida com outras soluções e que este tipo de procedimento prejudica a atuação da primeira instância e o atendimento aos jurisdicionados. “Tudo isso ocorre a pretexto de agilizarem-se os trabalhos nos tribunais, pouco importando o meio, pouco importando a gritante inversão de valores", contestou. “Pobre magistratura nacional, ante a ambivalência verificada! Pobre magistratura nacional, ante o abandono da sua razão de ser!”
Também em fevereiro, o Conselho Nacional de Justiça manteve a convocação apenas de juízes federais que vão auxiliar os trabalhos administrativos da presidência, da vice-presidência e da corregedoria regional do TRF-1. De acordo com a decisão, a medida deve ser feita dentro dos limites da Resolução 72 do CNJ que padronizou as regras para convocação de juízes de primeira instância.
Fonte: Consultor Jurídico