“Não é crime entregar um bebê para adoção, é crime abandoná-lo. A Justiça entende que a mãe biológica, nesse caso, está protegendo a criança porque ela será encaminhada para pessoas já cadastradas”, afirma a psicóloga do Setor de Estudos Familiares (SEF) da Vara da Infância e da Juventude de Belo Horizonte, Tânia Mara Liberato. Segundo o Cadastro Nacional de Adoção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no Brasil há quase 36 mil pretendentes a serem pais e mães e 6,5 mil crianças para serem adotadas.
É muito raro a Justiça receber uma criança recém-nascida para adoção. A maioria passou por violação de direitos e teve os pais destituídos do poder familiar após uma ação judicial. Para quem pretende adotar é necessária uma outra ação judicial, de adoção, que corre paralelamente. Assim, a criança somente poderá ser legalmente adotada depois de destituído o poder familiar, mas antes é possível que os pretendentes assumam a criança em casa, sob sua guarda, para fins de adoção.
Para quem pretende adotar, o primeiro passo é procurar a Vara da Infância e da Juventude para se cadastrar, apresentar documentos, passar pela sindicância de um comissário da infância e da juventude, submeter-se à avaliação psicossocial e fazer o curso preparatório para os possíveis adotantes, processo que dá aos candidatos a oportunidade de saber se querem realmente ser pais e mães.
Durante o curso, uma promotora, uma psicóloga e uma assistente social esclarecem sobre a realidade da adoção, desde o processo da habilitação até a adoção definitiva. A proposta é desconstruir mitos e orientar os interessados sobre os desafios de assumir a educação de um filho. A psicóloga da SEF, Letícia Greco, enfatizou, durante o curso em Belo Horizonte, que “no caso de adoções inter-raciais, por exemplo, o pai e/ou a mãe têm que estar preparados para enfrentar o preconceito da sociedade, que é um fato”. Ela citou várias situações de preconceito enfrentadas pelas famílias inter-raciais.
O contato com as famílias habilitadas é feito após a verificação, pelos profissionais da SEF, da sintonia das características da criança com o perfil indicado pelos pretendentes, na ordem cronológica de habilitação, que é a data em que o juiz deferiu o pedido. A pessoa tem que se apresentar o mais rápido possível para conhecer a história da criança, visitá-la na instituição de acolhimento, fazer os primeiros contatos e se decidir pela adoção, que começa com a guarda provisória. No caso de recémnascidos, os pais já saem da Vara da Infância e da Juventude com a guarda do bebê.
Tânia afirma que, no trabalho, ela lida com o pior e o melhor do ser humano, porque mesmo que a maioria das crianças tenha passado por processos terríveis de violação dos seus direitos, ela encontra pessoas dispostas a adotar crianças com deficiência ou soropositivas. “Também vemos pessoas com uma disponibilidade de afeto impressionante. Algumas histórias me fazem pensar que eu ainda tenho muito que evoluir”, afirma a psicóloga.
A maioria dos adotantes, 65%, dá preferência para crianças de até 3 anos, brancas ou pardas. A Justiça se esforça para manter os irmãos biológicos juntos, mas 80% dos candidatos querem adotar apenas uma criança e, quanto mais velhos os meninos, maior é a dificuldade para encontrar famílias substitutas. Do total de crianças vivendo em instituições de acolhimento, 80% têm entre 6 e 17 anos.
O critério que a Justiça de Minas usa é o seguinte: primeiro buscam-se adotantes habilitados no cadastro local, em seguida no cadastro estadual e, se ainda assim não se conseguir encaminhar a criança ou o adolescente, o próximo passo é o cadastro internacional, que será tema de outra matéria no Portal TJMG. Dependendo das características exigidas para a criança pretendida, o processo pode levar mais ou menos tempo.
A pedagoga V.B., de 41 anos, que está se habilitando para adotar um bebê de 0 a 2 meses, sabe que vai ter que ter paciência para esperar muito, por ser essa a faixa etária mais pretendida pelos adotantes. Ela afirma que desde sempre tem vontade de ser mãe e que ao começar o processo de habilitação para adoção, passou a se sentir grávida. “Quando vou à Vara da Infância e da Juventude, sinto que estou indo a uma consulta de pré-natal, a ‘gestação’ é mágica, adquiri uma força impressionante”, afirmou.
O que norteia a atuação dos profissionais no processo de adoção – comissários da infância e da juventude, psicólogos, assistentes sociais, juízes e promotores – é a busca do bem-estar da criança. Para isso, eles desenvolvem cada etapa do trabalho focados no sucesso das adoções.
Fonte: TJMG