O registro civil está longe ser um simples pedaço de papel: o documento é um dos bens de maior valor na vida de uma pessoa, não só estabelecendo o nascimento dela para a vida civil, mas também remetendo às suas origens familiares, com todos os desdobramentos disso.

Mas, e quando esse documento traz um vazio no lugar onde deveria constar o nome do pai? É essa omissão que o projeto Paternidade para Todos, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), tem buscado sanar.

A iniciativa, que estimula o reconhecimento de paternidade, venceu o X Prêmio Conciliar é Legal, realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na categoria “Tribunal de Justiça”. A premiação será entregue em 18 de fevereiro, em Brasília.

 Nelson Missias de Morais (C), ao lado dos juízes Maria Luiza Rangel (E), Rosimere Couto e Jair Francisco dos Santos (D), com a equipe do CRP

Bastante disputado, o Prêmio Conciliar é Legal busca identificar, premiar, disseminar e estimular a realização de ações inovadoras do Judiciário que contribuam para a pacificação social e, consequentemente, para o aprimoramento da Justiça, por meio do estímulo às práticas autocompositivas.

Tribunais, magistrados, instrutores de mediação e conciliação, instituições de ensino, professores, estudantes, advogados, cidadãos, empresas e outros entes privados apresentaram suas práticas de sucesso, que concorreram à premiação em dez categorias distintas.

Dimensão imensurável

“A dimensão do trabalho realizado pelo projeto Paternidade para Todos é imensurável, em especial se pensarmos no impacto que representa, para a vida de uma criança, preencher a omissão do nome do pai na certidão de nascimento”, ressalta o presidente do TJMG, desembargador Nelson Missias de Morais.

O chefe do Judiciário mineiro destaca o fato de que o reconhecimento de paternidade abre, para os filhos, uma série de horizontes, como a possibilidade de a pessoa construir um laço afetivo com o pai e conviver com a família do genitor. Representa, ainda, o resgate de inúmeros direitos.

“O CNJ, ao distinguir o valor do programa, muito nos orgulha, reforçando em nós a convicção de que estamos no caminho certo ao apostarmos na conciliação, em especial quando lidamos com esse bem tão precioso que é a família”, observa o presidente.

Sensibilidade e olhar humano

O Centro de Reconhecimento de Paternidade (CRP) surgiu em 2011, na capital, por iniciativa do juiz Fernando Humberto dos Santos, à época titular da Vara de Registros Públicos de Belo Horizonte. Desde então, o trabalho se consolidou — já são mais de 17 mil reconhecimentos de paternidade.

“Esse reconhecimento do CNJ é muito bom, pois coroa o trabalho da equipe do CRP. Ali atuam pessoas muito dedicadas, que se mobilizam para atender às partes, às vezes, para além do trabalho delas. O prêmio é um estímulo”, afirma a juíza Maria Luiza de Andrade Rangel Pires, da Vara de Registros Públicos da capital.

A magistrada, que há cinco anos está à frente do projeto, diz que são incontáveis as histórias de vida marcantes que conheceu, durante as audiências de conciliação no CRP — sessões, segundo ela, sempre permeadas de muita emoção.

“Esse reconhecimento do CNJ é muito bom, pois coroa o trabalho da equipe do CRP", avalia a juíza Maria Luiza de Andrade Rangel Pires

“Nosso cuidado precisa acontecer o tempo todo, quando o resultado do DNA é positivo ou negativo. Imagina o que é informar para uma adolescente, que cresceu achando que determinado homem é o pai dela, que o exame deu negativo”, exemplifica.

Por isso, explica a magistrada, o trabalho realizado pelo CRP é complexo e ao mesmo tempo delicado, exigindo sensibilidade e olhar humano. “O que nos importa ali é ajudar a pessoa na busca de sua identidade completa, para preencher a lacuna que falta em seus documentos e em seu coração. Quando isso acontece, ela ganha outro olhar para a vida”, ressalta.

Expansão

“Ao longo dos anos, fomos incrementando e aprimorando as ações do CRP na capital. Surgiu então o CRP Itinerante, levando o serviço para as comunidades e, nesse percurso, me veio essa ideia de expandir a iniciativa para as demais comarcas mineiras”, conta a juíza.

Na avaliação da magistrada, não era razoável uma iniciativa de tão grande alcance social ficar restrita à capital. “Temos regiões de mais pobreza em Minas, que precisam muito mais desse tipo de serviço. A ideia da expansão foi, de imediato, abraçada pelo presidente Nelson Missias.”

Assim, em 2019, a 3ª Vice-Presidência do TJMG, por meio da Assessoria da Gestão da Inovação (Agin), elaborou um plano de expansão da iniciativa para o interior do estado. Superintendente de Gestão da Inovação no Tribunal mineiro, a 3ª vice-presidente, desembargadora Mariangela Meyer, destaca a importância desse movimento.

A desembargadora Mariangela Meyer exalta a relevância do reconhecimento de paternidade

“Logo quando surgiu a sugestão da expansão pelos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs), a 3ª Vice-Presidência abraçou a ideia e acionou seu setor de inovação para que pudesse construir toda a sistemática necessária e viabilizasse a implantação do Serviço de Reconhecimento de Paternidade (SRP) no interior do estado. A expansão iniciou-se em Santa Luzia e, gradualmente, chegará a outras comarcas”, conta a desembargadora.

De acordo com a 3ª vice-presidente, a expansão do SRP para o interior do estado elevou o patamar do projeto, que passou a ter abrangência estadual e foi rebatizado como Paternidade para Todos.

A expansão para outras comarcas está sendo conduzida pelo setor de inovação do TJMG, vinculado à 3ª Vice-Presidência, que, com o apoio da Coordenação do Sistema Eletrônico de Informações (SEI), informatizou o procedimento pré-processual de reconhecimento de paternidade, tendo como base a ferramenta informatizada.

O SEI já está implementado em todas as comarcas de Minas, o que, além de possibilitar a tramitação online dos procedimentos de reconhecimento de paternidade, não gera custos para o Tribunal mineiro.

Celeridade e humanização

A desembargadora Mariangela Meyer exalta a “extrema relevância” do reconhecimento de paternidade, “porque oferece a possibilidade de solucionar, de forma célere e em ambiente humanizado, uma questão sensível a grande parte das famílias brasileiras”.

“A ausência do nome do pai no registro de nascimento do filho não representa apenas um vazio no nome, mas também um sentimento de rejeição.” Esse sentimento, avalia a desembargadora, pode influenciar na dificuldade do filho “de criar laços harmônicos com as pessoas ao seu redor”, aumentando as chances de esse indivíduo ingressar no mundo da ilegalidade.

“A figura do pai é importante na reprodução dos mistérios do patrimônio familiar e genealógico; a ausência dessa referência costuma produzir um vazio enorme, suficiente para bloquear a confiança e desestimular a busca de conquistas sociais”, pontua a magistrada.

O primeiro SRP

Primeira comarca do interior a ser contemplada com a iniciativa, Santa Luzia inaugurou seu SRP em fevereiro de 2019. Em um ano de atividades, já foram realizados ali mais de 100 reconhecimentos de paternidade e 45 exames de DNA.

A juíza coordenadora do Cejusc local, Edna Márcia Lopes Caetano, conta que foi um grande desafio aceitar a missão de instalar o primeiro SRP. “Começamos com muita vontade e garra, recebendo todo o apoio da Presidência. Plantamos uma semente, evoluímos, e por isso me sinto muito feliz e gratificada de ver o projeto reconhecido pelo CNJ”, declara.

Na avaliação da juíza, o prêmio do CNJ é importante, entre outros aspectos, por dar visibilidade à boa prática. “As histórias que temos presenciado são muito bacanas. Quando vêm aqui, as pessoas buscam a cidadania plena. Quando conseguem ter a paternidade reconhecida, elas saem abraçadas, chorando, comemorando; um novo ciclo é inaugurado na vida delas”, afirma.

Procedimentos no CRP

A juíza Maria Luiza Rangel explica que, quando o juízo é noticiado do registro civil de crianças sem o reconhecimento ou indicação paterna, o CRP inicia o procedimento extrajudicial de averiguação de paternidade.

O CRP também recebe adolescentes, adultos e até idosos que procuram conhecer seus laços familiares, abrindo ali o processo para essa averiguação. Em alguns casos, são pais que desconfiam da paternidade de uma pessoa e buscam essa confirmação.

Nas audiências de conciliação, há dois caminhos: o reconhecimento pode ser feito de forma espontânea ou é disponibilizada a realização de um exame de DNA, sem qualquer custo para as pessoas que não têm recursos financeiros, e de forma rápida.

Nos casos de reconhecimento espontâneo, o cartório fará a averbação dessa paternidade, alterando o registro da pessoa — inclusive o registro dos descendentes, quando a pessoa já tem filhos e netos.

Nas situações em que é feito o exame de DNA, ocorre uma segunda audiência para a divulgação do resultado. Se ele der negativo, é aberta a possibilidade da continuação do processo de averiguação da paternidade.

Laços socioafetivos

Além do reconhecimento de paternidade biológica, o CRP também atua em averiguação de maternidade biológica e paternidade de pai falecido e de pai preso, observados alguns critérios.

Também atua no reconhecimento de maternidade e paternidade socioafetiva. Nessa modalidade, o reconhecimento é feito a partir do vínculo de amor constituído entre filho e pais, desde que não haja o nome de um ou outro na certidão.

Conheça mais sobre o CRP aqui e confira aqui mais informações sobre o X Prêmio Conciliar é Legal.

 

Fonte: Assessoria de Comunicação Institucional - Ascom
Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG