À medida que condenações à prisão domiciliar se tornam cada vez mais populares nas cortes americanas, o tribunal superior da Pensilvânia decidiu examinar um caso em que terá de responder a uma pergunta ainda no limbo: a prisão domiciliar se encaixa ou não na definição de encarceramento?

Um tribunal de primeiro grau decidiu, em janeiro, que uma pessoa condenada à “prisão domiciliar”, uma alternativa à prisão, não é um “prisioneiro”. Mas nem todos os tribunais do país concordam. E decisões anteriores da Suprema Corte podem ter sido mal interpretadas pelos juízes, observou o tribunal superior da Pensilvânia, ao decidir examinar o caso.

Dessa resposta depende outra questão, no caso específico perante o tribunal: a pessoa em prisão domiciliar tem direito a seguro-desemprego? Prisioneiros não têm, definitivamente, direito a seguro-desemprego, bem como a outros direitos do cidadão comum. Mas, se “prisão domiciliar” não é a mesma coisa que “encarceramento”, então ela preserva seus direitos.

O caso específico perante a corte é o do americano Charles Chamberlain, condenado em novembro de 2012 a 60 dias de prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico, depois que se declarou culpado por dirigir um veículo sem inspeção, com carteira de motorista suspensa. Chamberlain foi autorizado a deixar a casa para trabalhar e para realizar tarefas indispensáveis, como fazer compras quando necessário, ir ao banco, à delegacia de polícia ou ao médico.

Ele se manteve no emprego por nove dias, depois de condenado. Mas foi demitido e, por esse motivo, requereu o pagamento semanal do seguro desemprego, que lhe foi concedido. Porém, o conselho de revisão do seguro desemprego concluiu que, na condição de prisioneiro, ele não tinha direito ao benefício e ordenou a restituição de US$ 1.719.

“Se Charles Chamberlain tivesse sido condenado à prisão, seu caso seria óbvio. A lei proíbe terminantemente o pagamento de compensações por desemprego a criminosos, enquanto eles estão encarcerados atrás das grades. Mas esse não é o caso”, decidiu a juíza de primeiro grau Patricia McCullough.

“O tribunal superior do estado não iguala prisão domiciliar a encarceramento, porque decidiu que o tempo servido por alguém em prisão domiciliar não pode ser creditado para redução de pena, caso a pessoa termine indo para a prisão”. Além disso, ela afirmou, “a Suprema Corte declarou especificamente, em uma decisão de 2005, que a prisão domiciliar não constitui custódia”.

A lei que regula o seguro-desemprego no estado, por sua vez, “deve ser interpretada de forma liberal, para proteger as pessoas que perdem o emprego sem culpa própria”, observou a juíza. “Desde que a prisão domiciliar não impedia Chamberlain de trabalhar, a intenção do conselho de bloquear o pagamento do benefício a alguém que foi removido da força de trabalho não é aplicável aqui”, ela decidiu.

Popularização
Condenações à prisão domiciliar estão se tornando mais populares nos tribunais americanos por diversas razões. A que mais pesa é a financeira: os contribuintes americanos pagam aproximadamente US$ 70 bilhões por ano para manter cerca de 2,3 milhões de prisioneiros atrás das grades. O custo anual é de US$ 30 mil por prisioneiro. Isso significa US$ 2.500 por mês ou US$ 83 por dia, por prisioneiro. O custo da prisão domiciliar é de US$ 9,39 por dia (incluindo o monitoramento eletrônico).

As informações estão no site da organização “Friends of Justice”, que aponta outras razões, mais práticas, para a popularização crescente da condenação à prisão domiciliar. Uma delas é a superpopulação das cadeias e presídios. Assim, os juízes começaram a buscar outros tipos de “candidatos” à prisão domiciliar — além de criminosos de colarinho branco e celebridades que, costumeiramente, se beneficiam dela.

Os juízes da Carolina do Norte foram os primeiros a encontrar um “candidato” ideal: os pais que não pagam pensão alimentícia e, normalmente, são mandados para prisões superlotadas. Ironicamente, diz a lógica dos juízes, o encarceramento impede os pais relapsos de trabalhar e ganhar dinheiro para cumprir suas obrigações paternas, ao mesmo tempo em que os contribuintes têm de pagar por sua estada na prisão.

Na maioria dos estados, os juízes estão buscando “candidatos” à prisão domiciliar, em alternativa ao encarceramento. Segundo os juízes, as estatísticas comprovam que a prisão domiciliar é apropriada para condenados por delitos não violentos e condenados pela primeira vez. “Com vigilância e tratamento adequados, os participantes desse programa alternativo irão, mais provavelmente, aprender a lição e se tornar membros produtivos da sociedade”, diz a argumentação.

“Obviamente, os programas de prisão domiciliar não são perfeitos. Mas a alternativa do encarceramento é claramente disfuncional e custosa. Está na hora de fazer um exame mais minucioso dessa alternativa e levá-la em consideração. Afinal de contas, são os criminosos que devem pagar por seus crimes, não os contribuintes, que são forçados a sustentá-los na prisão”, dizem os juízes.

De fato, alguns estados estão exigindo que os “prisioneiros domiciliares” paguem pelo menos uma parcela de seus custos, diz o Friends for Justice. Em Ohio, eles devem pagar US$ 5 por dia, para aliviar os custos dos contribuintes. No Alasca, US$ 14 por dia. Frequentemente, têm de pagar os custos de instalação e manutenção do dispositivo de monitoramento eletrônico, bem como dos testes exigidos de consumo de drogas.

A comunidade jurídica apoia, de uma maneira geral, esse programa, mas alguns não chegam a se empolgar, porque não o veem como uma panaceia para o complexo (para não dizer falido) sistema de justiça criminal dos EUA. Os defensores desse programa se esquecem, dizem os críticos, que o fator que mais gera criminalidade e a consequente superlotação do sistema carcerário é a pobreza. E ninguém está buscando soluções sérias para esse problema.

Fonte: Conjur